247 - A presidente Dilma Rousseff abriu seu
pronunciamento na abertura da 68ª Assembleia Geral da ONU batendo duro
na espionagem praticada pelos Estados Unidos contra o governo
brasileira. Ele chamou o ato de "ataque à soberania nacional e aos
direitos humanos". Dilma anunciou o que o Brasil está propondo a criação
de "um mecanismo multilateral" de regulação democrática na internet, á
fim de evitar novas invasões de privacidade.
Abaixo, notícia anterior:
Nesta terça-feira (24), a presidente Dilma Rousseff discursa pela
terceira vez na abertura da Assembleia-Geral da Organização das Nações
Unidas (ONU). O chefe de Estado brasileiro é sempre o primeiro a
discursar porque o Brasil foi o primeiro país a virar membro da ONU, em
1945, após a Segunda Guerra Mundial (Assista o discurso ao vivo).
Em meio a polêmica entre Brasil e Estados Unidos gerada pelas
recentes denúncias de espionagem, Dilma usará um discurso em favor do
respeito à privacidade dos cidadãos e à soberania dos países. Seu texto
apresentará a invasão de privacidade dos cidadãos como uma violação de
direitos humanos. Na última terça-feira (17), a presidente anunciou o
adiamento da visita de Estado que faria em outubro a Washington, nos
Estados Unidos, após os casos de violação de privacidade da Petrobras e
das conversas do gabinete da Presidência do Brasil. A fala de cerca de
30 minutos antecede o discurso do presidente norte-americano, Barack
Obama.
Antes de discursar na assembleia, a presidente levou a proposta nesta
manhã de regulamentação do acesso a conteúdo de internet e a crítica à
atuação da NSA diretamente ao secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon.
Em 2011, a presidente se tornou a primeira mulher a discursar na
abertura dos trabalhos da principal reunião de chefes de Estado da ONU.
“Pela primeira vez na história das Nações Unidas, uma voz feminina
inaugura o debate geral. É a voz da democracia e da igualdade se
ampliando nesta tribuna que tem o compromisso de ser a mais
representativa do mundo”, ressaltou.
Nos anos anteriores, em 2011 e 2012, Dilma chamou atenção para a
crise econômica e defendeu a construção de um amplo pacto pela retomada
do crescimento global. “Mais que nunca, o destino do mundo está nas mãos
de todos os seus governantes, sem exceção (…). Essa crise é séria
demais para que seja administrada por uns poucos países”, frisou, no
primeiro ano.
Ela também afirmou que o Brasil já estava pronto para assumir suas
responsabilidades como membro permanente do Conselho de Segurança. “As
guerras e os conflitos regionais, cada vez mais intensos, as trágicas
perdas de vidas humanas e os imensos prejuízos materiais para os povos
envolvidos demonstram a imperiosa urgência da reforma institucional da
ONU e em especial de seu Conselho de Segurança”, defendeu, no ano
posterior.
Leia, ainda, a análise de Tereza Cruvinel, do Correio Braziliense, sobre o discurso de Dilma:
A fala na ONU
O protesto contra a espionagem americana no Brasil e o chamado à
comunidade internacional para a criação de mecanismos de governança da
internet serão o ponto forte do discurso com que a presidente Dilma
Rousseff, por força da tradição, abrirá hoje a Assembleia Geral da ONU.
Com o adiamento da visita a Washington ainda ecoando, Dilma lançará uma
agenda nova, esperando fortalecer o protagonismo do Brasil, destacando
sua postura altiva diante da maior potência, dizem vozes palacianas. E,
também, é claro, colher o aplauso interno. Analistas não descartam,
porém, o risco de sua fala cair na irrelevência, seja por desinteresse
da comunidade internacional, resignada ao fato de que todos espionam,
cabendo a cada país se defender, seja pela maior atenção ao encontro
entre Barack Obama e o novo presidente do Irã, Hassan Rohani, que pode
levar a uma distensão nas hostilidades que prosperaram durante a
presidência de Ahmadinejad.
Também por força da tradição, Obama falará logo depois de Dilma, podendo tanto fazer uma breve referência a essa parte do discurso dela como passar ao largo, o seria ruim para a aposta brasileira na definição de uma nova agenda, diz o presidente do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri), Luiz Augusto de Castro Neves. Ele considera acertado o adiamento da viagem diante das circunstâncias criadas pelas denúncias de espionagem. Dilma não poderia ir à Casa Branca tendo esse assunto como pano de fundo, embora fosse tratar de outros importantes. Entre eles, um acordo para que os Estados Unidos pudessem voltar a usar comercialmente a Base de Alcântara para lançamento de satélites e a possibilidade de um pronunciamento mais afirmativo a favor da pretensão brasileira a um lugar no Conselho de Segurança da ONU. Haveria também enorme constrangimento se, no curso da visita, surgisse outra denúncia envolvendo o Brasil.
Isso posto, ele acha que tudo dependerá da ênfase que ela porá na
questão da espionagem. Se conferir excessiva importância ao tema, como
gostariam alguns setores do governo, poderá colher a indiferença dos
demais países. Por um lado, o encontro entre Obama e Rohani, durante a
Assembleia da ONU, será acompanhado com enorme atenção. Os dois países
romperam relações há 35 anos e viveram às turras na presidência
anterior. "Certamente, esse será um evento concorrente com a fala da
presidente Dilma", diz Castro Neves. Depois, "outros países supostamente
espionados reagiram com mais moderação porque sabem que a espionagem é
inevitável. O Brasil é que tem sido muito displicente na defesa da
informação, ao ponto de o criptofone (misturador de vozes antiescuta)
ter caído em desuso nas conversas entre autoridades", diz ele. Tudo
dependerá, portanto, da disposição dos outros para comprar a proposta de
Dilma, que não está, de todo modo, inventando a roda. O tema já foi
debatido no Conselho de Direitos Humanos da ONU, em Genebra, onde alguns
países já defenderam a proteção da privacidade como direito
fundamental. A Unesco e a União Internacional das Telecomunicações
(UIT), duas agências da ONU, também já debatem a regulamentação da
internet, no que toca à proteção de dados e informações. No vácuo atual,
controlando a maior parte das redes e as tecnologias, os Estados Unidos
deitam e rolam.
Força do estigma
Castro Neves atribui à rejeição brasileira a tudo que veio da
ditadura o descaso com as atividades de contrainformação. O SNI era um
serviço voltado para a identificação e a repressão dos adversários do
regime. Parte do entulho autoritário, com a redemocratização, foi
transformado na Abin, que, até hoje, não encontrou seu papel e lugar no
Estado brasileiro. É vista com desconfiança e associada à "arapongagem"
com fins nem sempre virtuosos.
O despreparo brasileiro não é menor para lidar com outro grande perigo do mundo atual, a guerra cibernética. "Estamos na infância", admitiu o ministro da Defesa, Celso Amorim, em entrevista que o Correio publicou anteontem, embora lembrando que os outros países estão começando a montar seus esquemas preventivos aos ataques que, por meio de vírus e armas digitais, podem atingir alvos militares ou aparatos logísticos, como hospitais ou aeroportos.
Outras frentes
Com mais ou menos ênfase na espionagem, Dilma apoiará a solução
diplomática proposta pela Rússia para a crise da Síria, e voltará a
cobrar a reforma do Conselho de Segurança para incluir o Brasil e outros
emergentes. Amanhã, ela participa de um fórum importante sobre
desenvolvimento sustentável e desdobramentos da Conferência Rio+20. Na
quarta, venderá a investidores seu peixe de estimação, as oportunidades
de investimento em projetos de infraestrutura no Brasil. A calhar,
depois do fracasso de um dos leilões de rodovia e do retraimento de
petroleiras americanas em relação ao leilão do Campo de Libra, a joia do
pré-sal. Ontem, o ministro Moreira Franco previu para 22 de novembro os
leilões dos aeroportos de Confins e do Galeão. O êxito de todos eles é
crucial, para o país e o governo.
Mais do mesmo
O tempo praticamente se esgotou para que fossem aprovadas regras
melhores para o pleito do ano que vem. O Movimento Eleições Limpas faz
hoje desesperada ofensiva a favor de seu projeto, realista e
progressista. Mas o Congresso deve nos dar é a minirreforma eleitoral:
mais do mesmo com mais facilidade. Hoje, o TSE pode nos dar é mais dois
partidos, o Pros e o Solidariedade. Já a Rede de Marina Silva mobilizou
milhares de pessoas, mas deve morrer na praia. É dura a vida num país
que negligencia seu sistema político.
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