Qual ser humano politizado
e instruído que não seja muito rico e que não integre algum esquema
empresarial ou político com interesses conflitantes com um mínimo de
decência humana, teme e repudia o pensamento legítimo de direita e o
ideário sobre organização social que essa ideologia luta para que se
torne hegemônico nos quatro cantos da Terra.
Nem
precisa ser “socialista”, seja lá isso o que for em um mundo atolado até
o pescoço no capitalismo, que, por definição, significa a valorização
do dinheiro em detrimento do ser humano. Sejamos honestos: se você não
for canalha ou ignorante, entende que o pensamento de direita se baseia
no egoísmo e na desonestidade intelectual.
O
pensamento de direita só faria sentido em uma sociedade sem desigualdade
de oportunidades, pois tal ideário se baseia na premissa do “mérito”
sem levar em conta que vencer na vida (nos estudos e no trabalho,
sobretudo) também depende de vantagens que as crianças e adolescentes
recebem de herança dos pais.
Um dos
exemplos mais eloquentes sobre como o ideário de direita é desonesto se
encontra no sistema que impõe aos estudantes que disputam vagas no
ensino público superior. Os vestibulares são uma aberração. Põem jovens
paupérrimos, sem o mínimo acesso a bens culturais, para disputar vagas
com jovens ricos que estudaram em escolas de excelência.
Grande mérito, o dos que chegam na frente…
Os
ideólogos desse pensamento bárbaro e injusto, acalentado e difundido
pela máquina de comunicação que a riqueza de que dispõe a direita impôs à
humanidade, infectam qualquer sociedade livre, sendo sua verborragia
obscena o preço a pagar pelas liberdades individuais. Temos que ser
livres até para sermos os piores canalhas que se possa conceber.
No
Brasil, a nossa direita choca as pessoas decentes e humanas mesmo que
não tenham ideologia e politização. Muitos se chocam com o pensamento de
direita sem nem saberem que é um pensamento político-ideológico.
Que
cidadão decente, minimamente sensível e razoavelmente humanista pode
concordar com o comportamento de alguém como o deputado Jair Bolsonaro,
com seu racismo galopante, sua homofobia descontrolada e sua truculência
(inclusive física) escancarada?
Bolsonaro,
porém, não passa de expressão da direita desinibida, daquela que não
tem vergonha de se assumir. Mas há outros expoentes desse pensamento que
tentam disfarçar seus pendores autoritários, antidemocráticos,
desumanos, egoístas.
Um
Reinaldo Azevedo (colunista e blogueiro da revista Veja), por exemplo,
simboliza a direita dissimulada, que não tem coragem de assumir seu ódio
à diferença, seu apreço pela desigualdade, sua crença inabalável na
segregação racial e social etc. Aliás, a própria revista, ou melhor, o
próprio Grupo Abril é uma máquina de propaganda da direita, ou da
ultradireita.
Só para
abreviar este capítulo da direita brasileira, recorro ao verbete da
Editora Abril na Wikipedia, de modo a resumir a natureza desse grupo
empresarial:
“(…) Em
5 de maio de 2006, a empresa de mídia sul-africana Naspers adquiriu 30%
das ações do Grupo Abril. Para tanto, pagou 422 milhões de dólares.
Tratou-se da terceira transação a fazer uso das possibilidades abertas
pela emenda constitucional nº 36, de 2002, que permite a presença de
capital estrangeiro em empresas jornalísticas e de radiodifusão – antes
completamente vedada – até o limite de 30%.
O
novo dispositivo constitucional fora ‘inaugurado’ pela própria Abril,
quando, em agosto de 2004, ela recebeu um aporte do fundo de
investimentos Capital Group, que passou a deter 13,8% da empresa. A
Naspers foi um dos esteios do regime do apartheid na África do Sul e
prosperou com a segregação racial (…)”
—–
Precisa dizer mais?
Enfim, a
direita brasileira é horrorosa. Chocante mesmo. Sua luta incansável
contra o programa Bolsa Família, programa emergencial para socorro de
legiões de miseráveis que vem sendo elogiado e copiado até por grandes e
prósperas democracias, resume o ideário da direita brasileira.
Ainda
assim, há um certo pudor da “nossa” direita em assumir seu egoísmo
imanente. Nunca se viu essa manifestação da maldade e do ódio chegar ao
ponto de pregar contra o precário sistema público de saúde que o Brasil
construiu e que, a duras penas, garante a cada brasileiro que não morra à
míngua sem qualquer atendimento.
Ou seja: a direita brasileira tem limites, voluntária ou involuntariamente.
Quando
se olha para o que a direita norte-americana fez com o país mais rico e
desenvolvido do mundo, chega-se a dar graças a Deus pela direita que
infesta o nosso país. Pode ser considerada altamente progressista, sob
tal comparação.
Reflita,
leitor, sobre o que a direita dos Estados Unidos vem fazendo nessa
questão do orçamento federal. Está sabotando não só o próprio país, mas o
mundo.
Em um
momento em que a potência hegemônica começa a se recuperar dos estragos
que o partido Republicano causou ao longo da primeira década do século
XXI, esse partido se nega a aprovar o orçamento federal caso o
presidente Barack Obama não retroceda da implantação de um arremedo de
sistema público de saúde que mal chega aos pés do nosso SUS.
A conduta dos republicanos é tão imoral que chocou até a nossa direita. Na edição do Jornal da Globo da última terça-feira,
até o colunista Arnaldo Jabor se insurgiu contra seus congêneres
ideológicos norte-americanos. Sim, Jabor, que vive a vituperar contra
“esquerdismo” em seus comentários naquele telejornal.
Reproduzo, abaixo, o comentário dele sobre o que está perpetrando o partido republicano.
—–
“O
Obama disse bem: o país está ameaçado por uma cruzada ideológica de
direita… É isso, a alma republicana não admite a lei de assistência
médica que beneficia 15% do povo, que não pode pagar.
Eles não admitem que pobres sejam ajudados porque, para americano, pobre é vagabundo, fracassado, e ninguém pode pagar por ele.
Dizem que ele nem é americano, o Obama. Que é comunista…
O
partido Republicano está dominado pelo Tea Party e seu líder disse: ‘A
lei da saúde é a mais sórdida lei que o ser humano já conheceu…’
O
SUS americano, o ‘Obamacare’, já foi votado há três anos e o supremo
tribunal federal já referendou, mas os republicanos querem chantagear o
presidente de qualquer maneira, mesmo quebrando a América.
Sabe o que é isso, os Estados Unidos dando calote em suas dívidas? Imagine a repercussão no mundo, já em crise…
Mas
os canalhas não ligam, são irracionais e loucos mesmo. Não se conformam
com um presidente negro, preocupado com questões sociais, querendo
taxar mais os ricos. Há racismo nisso, sim. Forte.
E
há o desejo de destruir o seu mandato. E pior: além da chantagem,
querem culpar o Obama pelo impasse, fingindo que querem negociar.
Já são quatro anos de sabotagem. Obama está definhando, mas não vai ceder. Só negocia se deixarem a saúde intacta.
Ele está certo. É melhor enfrentar essa chantagem, e sua desgraça, do que continuar essa ópera bufa”
—–
Alguns
dirão que é demagogia de Jabor, que, como a Globo, vem tentando melhorar
a própria imagem. Mas esse pudor da direita brasileira mostra a
distância que, graças a Deus, ainda separa os ideólogos de direita desta
nação e os seus homólogos estadunidenses.
E note,
leitor, que o sistema de saúde de Obama nem é um SUS da vida. Na
verdade, para simplificar, trata-se de um mega plano de saúde estatal
para que os mais pobres possam recorrer à medicina privada. E cheio de
limites de coberturas que, em nosso sistema de saúde público, não há.
O
egoísmo, pois, é uma instituição americana. A mentalidade do americano
médio o faz levar os psicopatas do partido Republicano ao poder a
intervalos tantos, o que faz com que o país mais desenvolvido da face da
Terra tenha a menor expectativa de vida entre os países desenvolvidos.
Além de pobreza e desigualdade que não se vê em nenhum país rico.
A boa
notícia é que a nossa direita é mais envergonhada que a deles e não tem
coragem de ir tão fundo nesse culto obsceno ao egoísmo, à desumanidade, à
canalhice em estado puro. A má notícia é que essa mesma direita
brasileira acredita que, um dia, poderá reproduzir por aqui a
imoralidade vigente no sistema de organização social norte-americano.
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