Lei votada na Câmara cria grupo de sete pessoas para, em dois anos, investigar crimes cometidos contra os direitos humanos entre 1946 e 1988. Não há previsão de punições nem restrição à presença de militares. Parentes de vítimas da ditadura queriam mudanças, mas governo, autor do projeto, só aceitou sugestões de adversários de direita. Texto vai ao Senado.
André Barrocal
BRASÍLIA – A Câmara dos Deputados aprovou, na noite desta quarta-feira (21), projeto de lei proposto pelo governo, no ano passado, que cria uma Comissão da Verdade para investigar e trazer a público – mas sem aplicar punições – crimes contra os direitos humanos praticados entre 1946 e 1988. O projeto, que sofreu algumas modificações – todas sugeridas por partidos adversários do governo – foi remetido ao Senado, que também terá de apreciá-lo e votá-lo.
A votação seguiu roteiro traçado pelo governo no início do ano. Supondo que não conseguiria aprovar uma comissão diferente da que propôs - com poderes punitivos, por exemplo – em um Congresso sensível à pressão militar, o governo trabalhou para que a votação ocorresse quase sem debates e de forma acelerada. Seria uma forma de contornar resistências.
Para isso, articulou para que fosse aprovado um instrumento que permitiria ao plenário votar o projeto mesmo sem que nenhuma comissão tivesse se pronunciado antes. O pedido de "urgência urgentíssima" passou por 351 votos favoráveis e 42 contrários. Feito isso, o mesmo plenário, logo em seguida, votou o projeto, o que ocorreu de forma simbólica, de modo que não há um placar a registrar o resultado.
Pelo projeto, a Comissão terá sete membros, designados pelo presidente da República, e prazo de dois anos para esclarecer crimes de perseguição, tortura e morte com motivação política cometidos num período de 42 anos. Seus integrantes vão receber salário de R$ 11 mil mensais.
O texto recebeu três pequenas alterações, negociadas pelo governo com adversários de PSDB, DEM e PPS. A pedido dos tucanos, a Comissão poderá tomar depoimentos espontaneamente oferecidos. Por sugestão dos democratas, seus integrantes não poderão ser dirigentes partidários, nem ocupar cargos de confiança no governo. E, por obra do PPS, decidiu-se que o conteúdo produzido pela Comissão será enviado ao Arquivo Nacional, para ficar disponível à consulta pública.
A criação da Comissão tinha o apoio de parlamentares mais à esquerda, mas eles achavam que o projeto proposto pelo ex-presidente Lula avançava pouco para que realmente fosse feita Justiça contra torturadores e assassinos. Familiares de vítimas da ditadura militar também tinham críticas ao projeto e, por isso, eram contra a votação “urgentíssima”.
A maior reclamação era contra o fato de que a Comissão não terá poder para punir criminosos, mandando-os a julgamento e à cadeia. Havia queixas também contra a possibilidade de militares integrarem a Comissão e contra o recorte de tempo (42 anos) Seria tempo demais para que apenas sete pessoas possam investigar de forma eficaz. Por isso, defendiam que a Comissão tivesse foco na ditadura militar de 1964-1985.
Durante as semana, familiares de vítimas percorreram gabinetes de deputados, fazendo pressão para que houvesse mudanças, mas não tiveram sucesso.
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