Guerrilheiro Virtual

domingo, 6 de novembro de 2011

A idade do ódio, aqui e no mundo

Duas situações – uma, internacional, outra, em nosso país – trazem-nos a sensação angustiosa de que os homens perderam a sua essência moral e retornam velozmente à idade do instinto dos répteis; enfim, desumanizam-se.

Mauro Santayana

Duas situações – uma, internacional, outra, em nosso país – trazem-nos a sensação angustiosa de que os homens perderam a sua essência moral e retornam velozmente à idade do instinto dos répteis; enfim, desumanizam-se. Prepara-se, sem quaisquer disfarces, a guerra contra o Irã. Não basta o que se faz no Afeganistão, no Iraque, na Líbia e na Palestina. Os belicosos de Israel, com o apoio da Grã Bretanha e da França, e o estímulo dissimulado de Washington, acreditam que lhes será possível atacar impunemente as supostas instalações nucleares da velha Pérsia. Em lugar da retirada – inglória – do Iraque e do Afeganistão, já anunciada, o que se vislumbra é a ampliação do conflito. Como em todas as aventuras militares, sabe-se como esta se iniciará, com o bombardeio de alvos no Irã – mas não se sabe como acabará. Se não prevalecer o bom-senso em Tel-Aviv, podemos aguardar nova tragédia, se não formos arrastados a uma Grande Guerra Euroasiática, da qual poderemos escapar na América Latina, se a estupidez não nos contaminar.

Há dias houve sinais de esperança com a troca de prisioneiros entre Israel e o Hammas. Essa esperança durou menos do que algumas horas, com a decisão de Netanyahu de construir nova colônia em território alheio, como represália à decisão da UNESCO - pela maioria esmagadora de votos - de reconhecer o Estado da Palestina. Como se isso não bastasse, trata agora o governo extremista de Israel de preparar o bombardeio contra o Irã, com a presunção de que continuará impune, como tem ocorrido ao longo desses 63 anos de existência do estado judaico.

É uma pena que os governantes de Israel dessirvam a memória de um povo que se destacou na crônica de nossa civilização com as manifestações da inteligência, das artes e do humanismo. É uma lástima que os judeus sensatos, de Israel e do mundo inteiro, não consigam que seu governo aceite o convívio com o vizinho. Todas as explicações de Israel não desmentem a realidade de que os palestinos têm sido submetidos, nestas décadas, à humilhação e à opressão. Expulsos de suas terras familiares, confinados em espaços cada vez menores, submetidos ao racionamento de água e ao bloqueio comercial, os palestinos se tornaram os párias de nosso tempo.

A insensatez chega agora a nova aventura bélica, contra um povo muito mais numeroso, com forças militares preparadas, e que, em uma escalada bélica, poderá construir aliança com potências de primeira grandeza – ainda que não tenham bombas atômicas como os agressores. Será um conflito do qual dificilmente Israel sairá sem perdas políticas e humanas consideráveis. Isso, na melhor hipótese.

A outra manifestação de ódio é a que se registra, aqui no Brasil, contra Lula, no momento em que o ex-presidente passa pela hora mais difícil de sua vida, ao enfrentar a doença que já atingiu dramaticamente a própria família. É doloroso que, entre os que se excitam com seu sofrimento se encontrem pessoas das quais se poderia esperar o mínimo de entendimento do mundo. A internet se tornou, nesses dias, o repositório das frases mais repulsivas. Felizmente essa fúria dos covardes tem encontrado a repulsa de todo o povo brasileiro – já que eles, pelo seu comportamento, se excluem da comunidade nacional.

É possível divergir de Lula, de seu governo, de seu partido, de suas idéias. Mas não se trata de Lula, o político, o alvo dessas manifestações de ódio. Não se odeia o ex-presidente da República. Odeia-se o menino de Pernambuco que arrombou as portas da História e, em nome do povo mais humilhado e vilipendiado do país, assumiu o governo e colocou o país entre as nações mais respeitadas de nosso tempo.

Enfim, e para não perder a razão das coisas, é uma questão de classe. Só isso.

Mauro Santayana é colunista político do Jornal do Brasil, diário de que foi correspondente na Europa (1968 a 1973). Foi redator-secretário da Ultima Hora (1959), e trabalhou nos principais jornais brasileiros, entre eles, a Folha de S. Paulo (1976-82), de que foi colunista político e correspondente na Península Ibérica e na África do Norte.

Do CartaMaior

Nenhum comentário:

Postar um comentário

”Sendo este um espaço democrático, os comentários aqui postados são de total responsabilidade dos seus emitentes, não representando necessariamente a opinião de seus editores. Nós, nos reservamos o direito de, dentro das limitações de tempo, resumir ou deletar os comentários que tiverem conteúdo contrário às normas éticas deste blog. Não será tolerado Insulto, difamação ou ataques pessoais. Os editores não se responsabilizam pelo conteúdo dos comentários dos leitores, mas adverte que, textos ofensivos à quem quer que seja, ou que contenham agressão, discriminação, palavrões, ou que de alguma forma incitem a violência, ou transgridam leis e normas vigentes no Brasil, serão excluídos.”