Guerrilheiro Virtual

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

O que Obama quer?

Atilio Borón
Doutor em Ciência Política pela Harvard University. Professor titular de Filosofia Política da Universidade de B. Aires, Argentina. Ex-secretário-executivo do Cons. Latin. de Ciencias Sociales (CLACSO)
Tradução: ADITAL

Por que Barack Obama gostaria de reunir-se com a presidente Cristina Fernández, da Argentina?

Sobram as conjecturas; porém as escassas –e também críticas- declarações procedentes de Washington remetem a uma agenda contendo temas tais como a suposta presença de grupos terroristas iranianos operando na América Latina e, particularmente, na Argentina, e a excessiva flexibilidade da legislação nacional com relação à lavagem de dinheiro, o que teria originado o bloqueio estadunidense a créditos outorgados pelo BID e pelo Banco Mundial.

Na realidade, esses assuntos carecem de substância: o dos iranianos é, em parte, a clássica paranóia de Washington e, em parte, uma tática para pressionar nossos países e para isolar, satanizando-o, ao Irã. Sobre a lavagem de dinheiro, é outra acusação que carece de fundamento, sobretudo, quando quem a esgrime tem a uns cem quilômetros da Casa Branca um dos paraísos fiscais mais importantes do mundo: o Estado de Delaware, que divulga por todos os meios que qualquer companhia que ali instale sua matriz, mesmo um diminuto escritório, estará eximida do pagamento de impostos por todos os ingressos produzidos por suas subsidiárias que desenvolvam suas atividades fora dos pequenos limites desse Estado, seja dentro dos Estados Unidos ou no exterior. Por isso, 60% das 500 maiores transnacionais listadas na revista Fortune têm seus escritórios centrais nesse Estado, que além de vangloriar-se de ter uma legislação que "não põe limites à usura”.

Dados esses antecedentes e sempre levando em consideração que jamais se pode confiar na mentirosa benevolência do imperialismo e de seus porta-vozes (quem tiver dúvidas, melhor medita sobre o que aconteceu com Gadafi), a hipótese que se perfila com mais força para compreender o sentido do convite de Obama diria que está motivado pelo desejo de sabotar, por agora diplomaticamente, o projeto integracionista representado pela Unasul e isolar aos governos de esquerda da região, principalmente a Venezuela de Chávez.

O Acordo do Pacífico, recentemente promovido pelos Estados Unidos e secundado pelo México e pela Colômbia, Chile e Peru equivale a introduzir o Cavalo de Troia dentro da Unasul. Não é casual que a inesperada solicitação para reunir-se durante a Cúpula do G-20, em Cannes, tenha chegado pouco depois de que a presidenta pronunciara dois discursos enfaticamente ‘unasurianos', no domingo pela noite, após sua rotunda vitória eleitoral. A enfermiça obsessão de Washington é acabar com o experimento bolivariano e apoderar-se do petróleo da Venezuela, como já fez com o Iraque e com a Líbia. Para os falcões estadunidenses –dos quais Obama é seu solícito mordomo- a estreita relação consolidada ao longo desses anos entre a Argentina e a Venezuela é um modesto obstáculo que deve ser removido quanto antes.

A estratégia para 2012, ano em que se celebrará a crucial eleição presidencial na Venezuela, é chegar a esse momento com Chávez debilitado por uma intensa campanha desestabilizadora –que já começou!-, que inclui desabastecimentos seletivos de artigos de primeira necessidade, assassinatos feitos por militares colombianos infiltrados ilegalmente no país ou por lumpens recrutados para gerar uma sensação de absoluta insegurança cidadã e a permanente gritaria da "imprensa independente” (na realidade, a única instância organizativa que a direita tem, contando-se a debilidade de suas expressões partidárias), denunciando supostas restrições à liberdade de imprensa em um país onde desde um jornal, de uma rádio ou de um canal de televisão se pode fazer a apologia do magnicídio ou incitar à violência com total impunidade.

Dentro dessa estratégia global, separar a Argentina desse projeto integracionista sul-americano é um passo tático da maior importância. Avançar rumo a esse objetivo parecera ser o único sentido possível o convite feito pelo mandatário estadunidense.

Do Adital

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