Nada na legislação isenta de crítica os ministros do Supremo, como ninguém está isentado
O momento mais ilustrativo, na semana de julgamento do mensalão, não
veio de uma das várias condenações. Nenhuma surpreendeu. O momento
especial também não surpreendeu se considerado o seu protagonista. O
teor, sim, foi ilustrativo.
O ministro Joaquim Barbosa não suportou ouvir o ministro-presidente,
Ayres Britto, dirigindo-se aos que, de fora do tribunal, tenham feito
alguma crítica ao desenrolar do julgamento. Interrompeu-o: "Presidente, o
Supremo Tribunal Federal não tem que dar satisfação a ninguém!"
Daí em diante, tratou ele próprio dos seus críticos, pessoas "irresponsáveis", em particular "um ex-juiz, hoje comerciante".
O Supremo tem a função de proteger a Constituição. Seja dirimindo
dúvidas quanto à afinidade de determinada questão com os preceitos
constitucionais, seja julgando condutas ou situações que se contraponham
ao Estado de Direito expresso pela Constituição.
A função do ministro Joaquim Barbosa, como a de seus colegas, é dar voz
ao tribunal. Mas a guarda da Constituição não é em abstrato. Há de ter
uma finalidade. E esta finalidade somos nós outros, cidadãos filhos e
pais de cidadãos e de futuros cidadãos, e são os nossos direitos. A
começar do direito de viver em regime democrático, no qual o direito de
crítica é um dos essenciais.
Para que cumpram tal função protetora é que nós outros pagamos os impostos com os quais são pagos os ministros do Supremo.
São eles, portanto, servidores públicos, denominação bastante clara
sobre quem é remunerado para prestar serviço a quem. E toda prestação de
serviço, público ou privado, implica a eventual prestação de
satisfações a respeito. Até por força de lei.
Nada na legislação isenta de crítica os ministros do Supremo, como
ninguém está isentado. O que não falta no Supremo, aliás, são críticas
mútuas. Com frequência, sem preservar nem sequer a civilidade.
E isso não se refere a ocorrências, não raras, distantes das câmeras da
excelente TV Justiça, conquista da cidadania claudicante e da cultura
democrática em construção. Ocorre na sala de julgamentos.
O ministro Joaquim Barbosa condenou Ayanna Tenório, funcionária do Banco
Rural ao tempo das transações com Marcos Valério. Os demais nove
ministros a absolveram. Só poderiam fazê-lo pelo voto, que é uma forma
de crítica frontal ao voto do ministro-relator.
Não compõem uma exposição de sinceridade as toneladas de elogios que os
ministros permutam o tempo todo. O que levou o ministro Marco Aurélio
Mello a dizer, já no julgamento do mensalão, que não seguiria o hábito
de fazerem todas as louvações à sabedoria de um voto para, em seguida,
contrariá-lo.
Em resposta a Joaquim Barbosa, os ministros Ayres Britto e Celso de
Mello lhe explicaram que as palavras aos críticos eram (e são)
esclarecimentos. Na mesma sessão de julgamento, a mais recente, o
próprio Joaquim Barbosa disse, por exemplo, que o dinheiro usado pelo
Banco Rural na trama com Marcos Valério "não é dinheiro próprio".
Claro, bancos são o mais esperto dos negócios inventados porque só usam dinheiro dos depositantes e aplicadores.
Mas, no capítulo da publicidade Visanet/Banco do Brasil, o
procurador-geral Roberto Gurgel, o relator Joaquim Barbosa e a maioria
dos ministros do STF afirmaram que o dinheiro era do Banco do Brasil.
Seria, como parece, só para permitir a afirmação de uso de dinheiro
público na trama chamada de mensalão? A esclarecer.
Janio de Freitas
No Falha
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