As provas mostram: Dirceu não tinha vínculos com Valério. Não pediu que
fosse a Portugal, não apresentou sua ex-mulher a ele. O PT não foi pauta
em reuniões.
Após analisar a conduta de inúmeros acusados, o STF inicia hoje o
julgamento de José Dirceu na ação penal 470. A defesa repudia, com base
em sólidas provas, cada uma das acusações apresentadas contra o
ex-ministro pela procuradoria-geral.
Um exemplo é o episódio da viagem a Portugal. Relembrando: Jefferson, no
ápice de suas midiáticas acusações, revelou que seu fiel escudeiro no
PTB, Emerson Palmieri, viajara a Lisboa com Marcos Valério e seu sócio
Rogério Tolentino. Dizia que a viagem teria sido orquestrada por Dirceu
para buscar milhões de euros nos cofres da Portugal Telecom.
Palmieri reconheceu em juízo que nunca sequer falou com Dirceu e que nem
sabe se a viagem “foi pra obter valores”. Mas, seguindo a cartilha de
Jefferson, disse que presenciou o publicitário se apresentando na
portaria da Portugal Telecom como “Marcos Valério do PT do Brasil”.
Tolentino e Valério sempre negaram essa versão, defendendo que a viagem
se deu por negócios com a Telemig.
Uma breve amostra sobre o debate acerca da consistência destes
testemunhos teve início na sessão de julgamento de Palmieri e Jefferson,
quando o ministro Ricardo Lewandowski observou que, segundo conclusão
da própria CPMI dos Correios, a viagem a Lisboa não tinha vínculos com o
PT ou José Dirceu.
O revisor ainda registrou a existência do testemunho judicial do
presidente da Portugal Telecom, Miguel Horta e Costa, que garantiu que
suas reuniões com Valério se davam sempre por conta da Telemig e que ele
jamais se apresentou como sendo do “PT do Brasil” ou ligado a José
Dirceu. Costa recebeu de sua secretária o anúncio de que na recepção
estava “Marcos Valério da DNA Propaganda”, não do “PT do Brasil”.
Assim, o episódio não pode ser usado como prova contra Dirceu. Ele, ao
contrário, escancara a intenção de Jefferson em criar fatos contra o
governo para desviar o foco das acusações de corrupção nos Correios.
Um outro episódio diz respeito à ex-mulher de José Dirceu, Ângela
Saragoça, que obteve empréstimo de R$ 42 mil no banco Rural e um emprego
no banco BMG. Ângela sempre garantiu que Dirceu não teve participação
ou mesmo ciência desses fatos e que foi apresentada a Marcos Valério
exclusivamente por meio de Silvio Pereira, seu amigo desde a fundação do
PT, nos anos 1980.
Seu testemunho foi acompanhado por todos os outros depoimentos no
processo. É importante observar que os fatos se deram quando a sua
relação conjugal com José Dirceu se encontrava encerrada havia mais de
dez anos, estando o ex-ministro já em seu terceiro casamento.
Numerosas provas também afastam a acusação de que as reuniões de Dirceu
com os representantes do banco Rural seriam indícios de sua ciência dos
empréstimos bancários.
Há inclusive uma testemunha que, presente em uma reunião oficial no
Hotel Ouro Minas, garante que questões afetas ao PT jamais foram
debatidas. O ex-ministro nunca favoreceu nenhum banco, seja o Rural ou o
BMG, e somente os recebia em encontros oficiais por dever de ofício.
Ficou provado que na Casa Civil existia um Comitê de Agenda destinado a
receber os pedidos de audiências e encaminha-los ao então ministro,
somente com a relação das empresas solicitantes, sem a indicação do nome
da pessoa responsável. Assim, se foi Marcos Valério quem fez os pedidos
de audiência, tais fatos não vinculam de forma alguma o publicitário
mineiro com Dirceu.
Enfim, todos os demais aspectos das acusações da PGR foram infirmados
por um sólido conjunto de provas produzidas ao longo da ação penal 470,
sendo impossível citar todas nesse espaço. O STF, guardião da
Constituição, zela pelo princípio da fundamentação dos atos decisórios,
que pressupõe que os indícios acusatórios devem ser adequadamente
confrontados com as provas apresentadas pela defesa.
Feita esta análise, o caminho que deve direcionar uma sentença justa é
bem resumido na lição da ministra Carmem Lúcia: “para a condenação,
exige-se certeza, não bastando a grande probabilidade”.
Ao final de uma ação penal em que o próprio procurador-geral da
República reconheceu dispor de “provas tênues” contra o ex-ministro da
Casa Civil, a justa absolvição de José Dirceu não é pleiteada com base
no princípio “in dubio pro reu”, mas sim na certeza que existem provas
mais do que suficientes da sua cabal inocência.
José Luis de Oliveira Lima, e Rodrigo Dall’acqua, são advogados criminalistas e defensores de José Dirceu na ação penal 470
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