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sexta-feira, 10 de agosto de 2012

Política e Direito no STF: o Caso "Mensalão"


“Os principais julgamentos numa alta Corte são predominantemente julgamentos políticos, porque eles sempre interpretam princípios e põem os fatos sob as lentes da ideologia e da cultura de cada Magistrado. O que a Constituição e a Lei determinam são os limites destas influências, que organizam qualquer ordem jurídica: são os limites que marcam e estruturam o Estado de Direito inscrito na Constituição. Não julgar contra as provas ou não condenar sem provas; não aceitar a emoção pública como decisiva para julgar, não permitir que o espírito de linchamento predomine. O artigo é de Tarso Genro.

Tarso Genro, Carta Maior

Depois de nomeado para a Corte Suprema dos Estados Unidos em 1937 descobriu-se que o novo integrante, o Juiz Hugo Black, fora membro da Klu Klux Klan no seu estado de origem, o Alabama. Erguendo-se acima dos seus preconceitos políticos e raciais, no processo 309 U.S. 227 (1940) (que chegou em grau de recurso àquela Corte), o Juiz - que militara na organização racista - proferiu um dos votos mais memoráveis da época, que se tornou jurisprudência modelar na luta pelos direitos civis no mundo inteiro.

No processo judicial em revisão, cidadãos negros tinham sido condenados por assassinato, com base em confissões obtidas sob violência e humilhação, portanto, sem provas obtidas legalmente. No impulso das emoções insufladas por aquela cultura reacionária predominante no Sul, mais uma injustiça brutal iria se perpetuar e foi tolhida pela coragem do Juiz Black.

O importante no voto-paradigma não foi a mudança da personalidade política do Juiz naquele julgamento, que a história já registrou em outras oportunidades com outros personagens: o ser humano gigantesco erguendo-se além das suas circunstâncias. A importância do seu voto foi para o Direito, sobretudo com os “fundamentos” da sua posição, acolhida pela Corte. Os fundamentos jurídicos, que expressam os princípios da Constituição, são o refúgio moral e jurídico em que um grande Juiz pode se abrigar, para resistir às circunstâncias da política e da força das emoções públicas. Estas podem ser manipuladas por interesses que se pretendem acima da lei e do ordenamento democrático legítimo, mas os princípios estão ali, na Constituição, à espera para se transformarem em fundamentos, em cada caso concreto.

Os principais julgamentos numa alta Corte são predominantemente julgamentos políticos, porque eles sempre interpretam princípios e põem os fatos sob as lentes da ideologia e da cultura de cada Magistrado. O que a Constituição e a Lei determinam são os limites destas influências, que organizam qualquer ordem jurídica: são os limites que marcam e estruturam o Estado de Direito inscrito na Constituição, para que Política e Direito sejam compatibilizados em cada decisão. Não julgar contra as provas ou não condenar sem provas; não aceitar a emoção pública como decisiva para julgar: não permitir que o espírito de linchamento predomine sobre a verdade ficta, que está contida no devido processo legal. Esta foi a lição imorredoura do Juiz Black.

“Sob o nosso sistema constitucional - proferiu o Juiz Black - os tribunais permanecem firmes, contra quaisquer ventos que soprem, como céus de refúgio para aqueles que podiam de outro modo sofrer por serem desamparados, fracos, a minoria, ou porque são vítimas não conformadas de erros e emoção pública. (...) Nenhum dever mais alto, nenhuma responsabilidade mais solene, repousa sobre esta Corte, do que a de traduzir em Direito vivo e manter este escudo constitucional deliberadamente planejado e escrito para o benefício de todo o ser humano sujeito à nossa Constituição - de qualquer raça, credo ou tendência.”
 
Artigo Completo, ::AQUI::
 

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