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sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

Um relatório revela o clube de elite de juristas que ganham milhões processando Estados


Corporate Europe Observatory (CEO)/Le Grand Soir

Tradução do inglês para o espanhol: Caty R.

Tradução do espanhol para o português: Renzo Bassanetti

Um pequeno grupo de sociedades jurídicas, árbitros e especuladores financeiros internacionais alimenta um boom da arbitragem sobre os investimentos, que custa bilhões de dólares aos contribuintes e impede legislar em interesse público, segundo um novo relatório do Transnational Institute e Corporate Europe Observatory.

“Profiting from injustice” (Os beneficiários da injustiça) traz à luz uma indústria jurídica opaca mas florescente, que beneficia as multinacionais em detrimento dos contribuintes, do meio ambiente e dos direitos humanos. As empresas jurídicas e os árbitros acumulam milhões graças às disputas relativas aos investimentos empreendidas contra os governos, defendendo ativamente a abertura de novas ações (1) e pressionando contra quaisquer reformas que se iniciem em prol do interesse público.

Segundo Cecília Olivet, do Transnational Institute, uma das autoras do relatório, “a independência e a imparcialidade presumíveis da arbitragem relativa aos investimentos são completamente ilusórias. Os governos têm as mãos amarradas, enquanto as multinacionais se beneficiam da imparcialidade intrínseca do sistema a favor do setor privado. Um punhado de empresas incentiva ativamente suas empresas clientes a processar os governos; enquanto isso, os principais especialistas em arbitragem utilizam sua influência para preservar as regras favoráveis aos investidores e manter o fluxo de procedimentos que gera milhões de dólares.

O relatório de 76 páginas explica que a arbitragem relativa aos investimentos, que originalmente foi concebida para os casos de expropriação direta, tem disparado nos últimos anos. Há 450 casos conhecidos em 2011, diante de 38 em 1996(2). O montante de gastos e indenizações também disparou, e os gastos com justiça e arbitragem se elevam a uma média de mais de 8 milhões de dólares por litígio, chegando a mais de 30 milhões de dólares em alguns casos (3).

O setor está dominado por um pequeno número de escritórios jurídicos ocidentais (4) e árbitros de elite(5). Três empresas, Freshield (Reino Unido), White & Case (EUA) e King Spalding (EUA), jactam-se de terem estado implicadas em 130 processos relativos a disputas de investimentos somente em 2011, enquanto que 15 árbitros – a “máfia interna” – decidiu 55% de todas as controvérsias conhecidas relativas aos contratos de investimentos.

Muitos árbitros também atuam como conselheiros, e ao mesmo tempo trabalham como pesquisadores, assessores governamentais, nos grupos de pressão e como comentaristas nos meios de comunicação. Alguns têm vínculos pessoais e comerciais sólidos com o mundo dos negócios. Esses vínculos lhes dão uma grande influência sobre esse sistema, em cuja preservação têm interesse direto(6).

O relatório descreve também um novo aspecto do setor da arbitragem relativo aos investimentos: o financiamento por terceiros. Cada vez mais, fundos de investimentos como o Burford (EUA), e Juridicia (Reino Unido), especulam sobre os casos, emprestando dinheiro às empresas para que estas persigam os governos, e ganham entre 20% e 50% da indenização final decidida na arbitragem(7).

As controvérsias emblemáticas Estados x investidores incluem a gigante do tabaco Philip Morris, que processou o Uruguai e a Austrália por avisos relativos à saúde nas carteiras de cigarros, e a companhia sueca Vattenfall, que exige 3,7 bilhões de dólares à Alemanha após a decisão nacional desta de abandonar a energia nuclear.

Alguns governos empreendem ações contra a arbitragem relativa aos investimentos. A Austrália já não autoriza disposições que prevejam mecanismos de arbitragem Estado-investidor em seus acordos. A Bolívia, o Equador e a Venezuela deram fim a vários contratos de investimento, e a África do Sul acaba de anunciar que não entrará em nenhum novo acordo e não renovará os antigos.

Segundo Pia Eberhardt, do Corporate Europe Observatory, a outra autora do relatório, “as atuações egoístas do setor de arbitragem relativo aos investimentos trouxeram à luz as injustiças inerentes ao centro do regime internacional dos investimentos. Os governos deveriam rechaçar a assinatura de contratos de investimentos, excluir as cláusulas que permitam às empresas processarem o Estado ou, ao menos, assegurarem-se de que as leis de interesse público, como as de proteção ao meio ambiente e aos direitos humanos não possam ser impugnadas”.

O relatório completo (por enquanto, somente em inglês) pode ser lido em http://www.tni.org/sites/www.tni.org/files/download/profitingfrominjustice_0.pdf

Notas:

(1) Recentemente, em plena crise da dívida grega, algumas sociedades jurídicas pressionaram as multinacionais para utilizar a arbitragem relativa aos investimentos para defenderem seus lucros. K&L Gates sugeriu a seus clientes que utilizassem a ameaça de arbitragem como “moeda de troca” nas negociações de reestruturação da dívida. Ao mesmo tempo, durante a guerra civil da Líbia, as empresas, entre elas Freshfields, aconselharam seus clientes sobre a maneira de utilizar os contratos de investimentos para demandar ao Estado líbio. Agora o novo governo corre o risco de ter que compensar as multinacionais que apoiaram a ditadura (ver capitulo 3).

(2) Em fins de 2011, a Conferência das Nações Unidas sobre o Comércio e o Desenvolvimento (CNUCED), contou 450 controvérsias Estado-investidor. Na medida em a maioria dos espaços de arbitragem entram em um domínio confidencial, o número real provavelmente é mais alto. Em 1196, foram registradas somente 38 controvérsias Estado-investidor no Centro Internacional de Regulação das Controvérsias de Investimentos (CIRDI) do Banco Mundial, responsável principal por esses investimentos. (ver capítulo 2 do relatório).

(3) Em 2009-2010, as companhias se envolveram em 151 casos, nos quais exigiam mais de 100 milhões de dólares aos Estados. Um governo acaba de ser condenado a ter que pagar mais de 1,7 bilhões de dólares de compensação (ver capítulos 2 e 3).

(4) As 20 empresas mais importantes são: Freshfields Deringer Brukhaus (Reino Unido), King & Spalding (EUA), Curtis Mallet-Prevost (EUA), Colt & Mosle (EUA), Sidley Austin (EUA), Arnold & Porter (EUA) Crowell & Moring (EUA) K & L Gates (EUA), Shearman & Sterling (EUA), DLA Piper (EUA), Chadbourne & Parke (EUA), Cleary Gottlieb Steen & Hamilton (EUA), Appleton & Associates (Canadá), Foley Hoag (EE.UU.), Latham & Watkins (EUA), Hogan Lovells (EUA / Reino Unido), Clyde & Co (UK), Norton Rose (Reino Unido), Salans (França) y Debevoise & Plimpton (EUA) (ver capítulo 3) 

(5) Os 15 árbitros de investimentos mais importantes são: Brigitte Stern (França), Charles Brower (EUA), Francisco Orrego Vicuña (Chile), Marc Lalonde (Canadá), L. Yves Fortier (Canadá), Gabrielle Kaufmann-Kohler (Suiça), Albert Jan van den Berg (Países Baixox), Bocksteigel Karl-Heinz (Alemanha), Hanotiau Bernard (Bélgica), Jan Paulsson (França), Stephen M. Schwebel (EUA), Enrique Álvarez (Canadá), Emmanuel Gaillard (França), William W. Park (EUA) y Daniel Price (EUA) (ver capítulo 4).

(6) Daniel Price trabalhou em um governo, como jurista no mundo dos investimentos e como árbitro. Beneficiou-se com os contratos de investimentos para cuja elaboração colaborou. Como Conselheiro Geral adjunto para o Comério na Câmara dos Deputados dos EUA, Price negociou as disposições relativas os investimentos segundo o Tratado de Livre Cãmbio Norte-Americano (ALENA), e o Acordo Bilateral de Investimentos Estados Unidos-Rússia. Quando a Rússia foi demandada em 103 bilhões de dólares, no quadro da ação mais importante jamais conhecida, os investidores o nomearam árbitro (ver capítulo 4).

(7) Os terceiros financiadores principais no setor da arbitragem são: Burford Capital (EUA), Jurídica Investment Ltd. (Reino Unido), Omni Bridgeway (Países Baixos), Fullbrook Management (EUA) e Calunius Capital (Reino Unido) (ver capítulo 5)

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