Decisão de Lewandovski pode revelar segredos importantes do julgamento
Ao liberar o conteúdo da pasta 2474 para oito advogados que haviam
pedido o direito de consultar um imenso conjunto de documentos que tem
relação penal 470, mas sempre foram mantidos em segredo, o ministro
Ricardo Lewandovski tomou uma decisão que pode ter relevância histórica.
A pasta 2474 era mantida em segredo por Joaquim Barbosa. Envolve provas,
fatos e indícios que não foram incorporados aos autos da ação penal.
Quando ele deixou a relatoria da ação penal, em agosto do ano passado, o
inquérito sobre foi redistribuído e entregue ao ministro Luiz Roberto
Barroso.
No mesmo dia, o advogado de Henrique Pizzolato, Martius Savio
Cavalcanti, marcou uma audiência com o ministro. Reapresentou o pedido
para ter acesso a pasta. Barroso prometeu uma resposta em três dias. Sua
decisão foi abrir mão do caso, alegando razões de "foro íntimo," que
não obrigam o juiz a fundamentar seu pedido em razões objetivas.
O caso foi redistribuído mais uma vez. Acabou nas mãos de Ricardo
Lewandovski que decidiu atender ao pedido dos advogados. Aqueles oito
que, no passado, tiveram seu pedido negado agora poderão ter
conhecimento de seu conteúdo.
É uma decisão importante.
Primeiro, porque permitirá que os réus e seus advogados tenham
conhecimento de todos os dados apurados na investigação – e que foram
excluídos dos autos sem que se possa saber exatamente por que.
Embora o julgamento já esteja em sua fase final – os réus estão presos,
alguns já pagaram multa, falta julgar os pedidos de embargos
infringentes – todos só terão a ganhar quando todos os dados forem
colocados a mesa.
É absurdo pensar que isso vai acontecer DEPOIS das sentenças mas é disso que estamos falando.
O segundo ponto é que a pasta 2474 oficializa fatos e provas que até
agora eram vistos de forma esparsa e informal. O interesse do advogado
de Pizzolato sobre o assunto não é casual. O papel de gerentes
executivos e diretores do Banco do Brasil que partilharam decisões
relativas a Visanet – assinando notas técnicas e definindo pagamentos --
nunca foi explicado na ação penal 470. Pode estar bem esclarecido na
pasta 2474, que reúne um inquérito sobre outros diretores.
Pizzolato foi condenado como "único responsável" pelo desvio de R$ 73,8
milhões para o esquema de Marcos Valério. Mas sequer era o responsável
pelos pagamentos, que tinham como gestor um outro diretor do banco,
nomeado, conhecido e identificado – e desaparecido dos autos da AP 470.
Uma das teses mais caras a defesa, a de que, se houve crime, ele não foi
cometido isoladamente, pode ganhar maior sustentação a partir daí.
Outros pontos também podem ser esclarecidos. Apesar de seus imensos
esforços para se aproximar do esquema Marcos Valério-Delúbio Soares, o
banqueiro Daniel Dantas sequer foi citado na ap 470. É curioso, já que
sua atuação foi descrita de modo detalhado pela investigação do delegado
Luiz Fernando Zampronha, da Polícia Federal.
Os publicitários Ramon Hollerbach e Cristiano Paz, da SMP&B, também podem ter acesso a informações que podem ser úteis.
O que pode ocorrer com isso? Difícil saber agora.
O lote de documentos reunidos na pasta 2474 é imenso. Compreende um
total de 78 volumes, que terão de ser estudados e conferidos.
A experiência ensina que documentos mantidos em segredo não fazem bem a
Justiça, que pede transparência e lealdade a todos. Não pode haver a
menor suspeita de distorção nem de qualquer irregularidade num caso
dessa relevância. Não se trata, é claro, de acusar nem denunciar por
antecipação.
O Caso Dreyfus, o mais conhecido caso de fraude jurídica da história,
levou cinco anos para ser esclarecido, embora o jjulgamento tenha durado
72 horas.
O erro de sua condenação foi estabelecido um ano depois do julgamento,
quando um oficial da área de informações resolveu fazer um novo exame
das provas e descobriu que nada havia para incriminar aquele jovem
capitão do Exército francês. Estava claro que o verdadeiro espião que
todos procuravam era outra pessoa.
Mas isso não adiantou muito. Para evitar uma revisão, começaram a surgir
novas provas – fraudadas – para incriminá-lo, o que atrasou o processo
por mais tempo. Condenado em 1895, Dreyfus seria liberado, por graça
presidencial, pois os tribunais jamais declararam sua inocencia, em
setembro de 1899. Um ano antes, o oficial que havia forjado documentos
para proteger os superiores foi desmascarado e cometeu suicídio.Paulo
Moreira Leite.
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