COMO SERÁ SEU NEGÓCIO EM 2020?
O QUE ALGUMAS EMPRESAS BRASILEIRAS ESTÃO FAZENDO PARA RESPONDER A ESSA PERGUNTA.
“Os 12 principais executivos da Embraer ficaram divididos entre o presente e o futuro nos últimos quatro meses. Além do dia a dia na fábrica de São José dos Campos, no interior de São Paulo, e das rotineiras viagens para encontrar clientes e fornecedores, eles participaram de oito encontros de 8 horas cada um, dedicados à espinhosa e arriscada tarefa de tentar antecipar a próxima década.
Na sala onde foram realizadas as reuniões, no escritório da empresa, na avenida Faria Lima, centro financeiro de São Paulo, uma infinidade de tabelas e projeções ilustravam o mais complexo planejamento de longo prazo realizado desde a privatização da Embraer, em 1994. Até 2010, os planos de longo prazo contemplavam um horizonte de cinco anos.
Agora, esse grupo é responsável por definir a estratégia para os próximos 15 anos, de forma que o negócio se mantenha competitivo até lá. Para traçar esse caminho, os executivos da Embraer estudaram temas que iam da crise europeia ao impacto da Primavera Árabe no preço do petróleo e discutiram como essas mudanças poderão provocar outras, alterando o ambiente de negócios.
Não é possível predizer o futuro. O máximo que qualquer companhia pode fazer é desenhar cenários possíveis e, a partir deles, tomar medidas que evitem grandes riscos.
Em 2010, a Embraer faturou 9,3 bilhões de reais — uma queda de 18% em relação a seu recorde histórico de vendas, 11,7 bilhões de reais em 2008. É trajetória que tem de ser revertida. Nos últimos cinco anos, a empresa vem diversificando suas fontes de receita e reduzindo o peso dos aviões comerciais em seu negócio.
Trata-se de estratégia que deve ser aprofundada até 2025. Até lá, 100 milhões de reais serão investidos ao ano, no que vem sendo chamado internamente de “projetos pré-competitivos”, cujos produtos deverão chegar ao mercado na próxima década.
"No futuro, venderemos sistemas para monitorar fronteiras e cidades, algo sem relação nenhuma com aeronaves", diz Frederico Curado, presidente da Embraer. "Quanto mais diversificada nossa atuação, mais protegidos estaremos da instabilidade do setor."
Traçar planos para a década seguinte é exercício novo para as companhias brasileiras, consequência direta da manutenção da estabilidade econômica. Mergulhado na hiperinflação, o Brasil foi, por muito tempo, o país onde o que importava era o agora e onde o amanhã sempre parecia estar muito distante.
O futuro, claro, continuará a nos surpreender, mas as grandes linhas da economia parecem traçadas. Segundo projeções do banco “Goldman Sachs”, em nove anos o Brasil passará da sexta para a quinta posição entre as maiores economias do mundo. Esse deslocamento seria capaz de gerar a criação de mercados e o surgimento de novos competidores.
"O Brasil está na mira dos investidores, e as empresas vivem momento de inflexão. Depois de crescer muito nos últimos dez anos, precisam de novas estratégias para manter o ritmo. E isso não se define da noite para o dia", diz o americano Paul Nunes, sócio da “Accenture” nos Estados Unidos e especialista em planejamento de longo prazo.
Embora seja responsabilidade dos principais executivos e dos conselheiros, a definição de uma estratégia de longo prazo tem sido cada vez mais um exercício coletivo. Na “Promon”, 120 profissionais participaram da criação do “plano 2020”, um processo que se estendeu de abril a dezembro de 2010.
O primeiro encontro foi um “workshop” de três dias que contou com 11 especialistas nacionais e internacionais, convidados a falar sobre suas áreas de pesquisa. Entre eles, estavam o americano Peter Schwartz, ex-chefe de planejamento de cenários da Shell, a primeira empresa a pensar de forma sistemática em estratégia de longo prazo nos anos 70, e Robert Carlson, um dos maiores especialistas mundiais em biotecnologia.
Após as apresentações, os funcionários da Promon foram divididos em oito grupos, formados por profissionais de diferentes níveis hierárquicos e áreas de atuação. Juntos, ele chegaram a 35 ideias de novos negócios. Agora, seis equipes de 16 pessoas vão acompanhar a evolução do mercado e a movimentação dos concorrentes para avaliar a melhor hora de tirar as ideias do papel. "Em agosto, como fruto do planejamento, compramos participações em três consultorias de gestão ambiental, uma área nova para a empresa", diz Luiz Fernando Rudge, presidente da Promon. "Até 2020, vamos entrar em negócios que sejam o estado da arte em termos tecnológicos."
O planejamento de longo prazo de companhias como Embraer e Promon pode levar à visão de novos negócios em mercados que façam sentido quando se olha para a empresa do presente. Mas rupturas em processos desse tipo são possíveis — e, em muitos casos, desejáveis.
A Braskem, por exemplo, prepara-se para depender, cada vez menos, de seu principal negócio, os plásticos feitos de petróleo, que hoje representam 90% das vendas. Esses produtos continuarão existindo, mas, pelo planejamento da empresa, serão responsáveis por apenas 50% das vendas em 2020. "Até lá, queremos nos tornar líderes mundiais em química sustentável, com produtos feitos de matérias-primas alternativas", diz Fernando Musa, vice-presidente de planejamento e desenvolvimento de negócios da Braskem.
No caso da Suzano, uma das maiores produtoras de celulose do país, o desafio é lidar com a perspectiva de redução no consumo global de papel. Entre 2009 e 2010, quatro executivos da empresa e uma equipe da consultoria McKinsey foram escalados para analisar os cenários de consumo até 2024 e, a partir daí, traçar um plano de negócios para a companhia.
A conclusão foi que o consumo de papel-jornal e de escrever diminuirá nos países desenvolvidos, mas se manterá em alta nos mercados da Ásia e da América Latina. E que algumas linhas de produtos não perderão espaço. "Aconteça o que acontecer, o computador não vai substituir o papel higiênico", diz Antonio Maciel Neto, presidente da Suzano.
"Claro que atentados ou crises podem mudar alguns aspectos do futuro. Mas as grandes tendências se manterão. E precisamos estudá-las para saber onde investir."
Planejar o futuro é inútil se não houver pessoas capazes de executar os planos com eficácia. "É preciso saber preparar a equipe para aproveitar as oportunidades que surgirão", diz Joan Ricart, professor de estratégia da escola espanhola de negócios IESE. Foi o que fez a subsidiária brasileira da Basf.
Definida em outubro de 2009, a estratégia 2020 da multinacional alemã projeta crescimento de 50% acima da média da indústria química e faturamento de 8 bilhões de euros na América do Sul até a virada da década. De acordo com o plano, a meta será alcançada com o lançamento de produtos nos mercados de tintas e de fertilizantes e defensivos agrícolas.
Para que isso ocorra, nesse período, a Basf terá de ampliar suas equipes dedicadas a pesquisa e desenvolvimento na região de 400 para 800 pessoas. Os cargos técnicos serão valorizados dentro da estrutura da empresa. Segundo o planejamento, em 2020, um pesquisador de destaque poderá receber salário similar ao de vice-presidentes, mesmo sem ter equipe.
"Nossa visão só será realidade se tivermos as pessoas certas conosco", diz Alfred Hackenberger, presidente da Basf para a América do Sul. "É preciso formá-las ou contratá-las desde já."
Planejamentos falham quase por definição. E, quanto mais longo for seu horizonte, maiores os riscos de fracasso. Por que, então, tentar antecipar o futuro num mundo cada dia mais instável? "É mais arriscado não se planejar do que traçar um caminho que se mostre equivocado", diz Lawrence Hrebiniak, professor da escola de negócios Wharton, nos Estados Unidos, e da HSM Educação, no Brasil.
"Mas as empresas que sabem se planejar não abraçam um único plano até o fim, independentemente do que aconteça no mundo." Os especialistas recomendam que planos de longo prazo sejam revisados a cada um ou dois anos, sem que percam o norte. É o que a companhia de energia EDP vem fazendo.
Seu programa 2020 foi definido no ano passado e será revisado anualmente pelos 35 principais executivos. Os projetos mais promissores para a próxima década, como microgeradores de energia eólica, estão em teste. Se não funcionarem, serão substituídos por outros, que respeitem a linha mestra da estratégia da EDP: gerar energia mais limpa e barata.
Três prédios públicos do Espírito Santo foram equipados com geradores de energia solar e eólica — num plano piloto para que, no futuro, clientes tenham a opção de vender ao sistema seu excedente de energia. "Se houver mudanças bruscas no mercado, não teremos problema para nos adaptarmos", diz Antonio Pita de Abreu, presidente da EDP. "A chance de errar existe, mas não mirar em nada seria um erro maior."
FONTE: publicado na revista “Exame” e transcrito no portal da FAB (http://www.fab.mil.br/portal/capa/index.php?datan=26/12/2011&page=mostra_notimpol). [imagem do Google adicionada por este blog ‘democracia&política’].
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