Claudius |
No dia 7 de outubro serão eleitos cerca de 70 mil vereadores em todo o
Brasil, 18,8 mil a mais que na última eleição, em 2008. Isso se deve
basicamente ao aumento da população e a uma decisão do Tribunal Superior
Eleitoral (TSE), que resolveu elevar para nove o número de vereadores
nos municípios com até 15 mil habitantes.
São 437.924 candidatos a vereador registrados no TSE este ano, número
25% maior que em 2008. Se cada candidato conseguir mobilizar pelo menos
cinco pessoas para ajudá-lo, teremos mais de 2 milhões de militantes
ativos nesta campanha eleitoral para eleger vereadores. Isso sem contar a
mobilização social para a eleição dos prefeitos.
Esse número maior de vereadores quer dizer que a democracia se ampliou
em nosso país? Temos mais parlamentares com a atribuição legal de
fiscalizar o Executivo e de propor leis que, em princípio, devem
defender o interesse público, buscar a melhoria da qualidade de vida dos
munícipes, propor políticas públicas para assegurar direitos a todos
os cidadãos. Mas, mesmo com mais parlamentares, ainda é difícil
responder a essa pergunta.
Importa também avaliar quanto esses vereadores têm se mostrado efetivos
no exercício do que as leis prescrevem como atribuições de seu mandato:
as medidas de fiscalização do Executivo que propõem; os projetos de
lei que apresentam; como participam da discussão e aprovação do
orçamento público municipal, dos planos plurianuais.
O perfil dos vereadores eleitos nas legislaturas anteriores mostra um
predomínio masculino − cerca de 88% são homens − e um grau de
escolaridade que retrata o mundo das desigualdades em nosso país. Dos
vereadores eleitos em 2004, por exemplo, quase a metade (48%) só tem o
ensino fundamental completo e 77% têm o ensino médio completo.
Esses vereadores precisam se haver com os regimentos internos das
câmaras municipais, com as formalidades e procedimentos da atuação
legislativa, com o desafio de promover a fiscalização do Executivo, que
por sua vez não apresenta transparência em seus processos e decisões e
normalmente resiste a qualquer tipo de fiscalização.
É muito comum que as ofensivas das prefeituras para assegurar a maioria
nas câmaras municipais, elemento importante da governabilidade,
encontrem esses vereadores dispostos a negociar seu apoio, seja em troca
de benfeitorias nas regiões que concentram seu eleitorado, seja em
benefício próprio. É o velho clientelismo, que combina com a perpetuação
das elites no poder. Os partidos políticos contam pouco nessa esfera
municipal e, na verdade, pouco se diferenciam uns dos outros. E assim se
formam maiorias nas câmaras municipais, seduzidas pelos executivos,
que relegam suas funções atribuídas pela Constituição e pelas leis
orgânicas municipais e passam a integrar a base de apoio do governo. Um
governo, na grande maioria dos casos, que governa para poucos. Os
vereadores que se mantêm independentes e críticos ficam confinados a uma
atuação de minorias, com pouca capacidade para mudar procedimentos e
essa lógica de balcão, a face visível da defesa de interesses privados.
Há uma combinação perversa que articula a precária formação da maioria
dos vereadores com a ausência de projetos partidários para atender ao
interesse público na sua cidade. Para não ser injusto com algumas
importantes iniciativas, vamos dizer que essa é a realidade da grande
maioria das cidades. Elas continuam gerando desigualdade, pobreza e
exclusão. E os governos ou não querem, ou não podem mudar essa lógica.
Essas minorias que resistiram e se mantêm comprometidas com a defesa do
interesse público são o que há de melhor nas câmaras municipais. É com
elas que as entidades e os movimentos da sociedade civil que integram
um campo político popular e democrático precisam se articular, dar
força a esses mandatos e utilizá-los como canal de expressão política
das demandas sociais e das pressões pela participação popular na gestão
pública.
As câmaras municipais são um espaço de disputa de poder. Elas aprovam o
orçamento municipal, definem políticas. A mudança no zoneamento urbano
cria incríveis oportunidades de negócios para o mercado imobiliário,
por exemplo. Mas algumas câmaras também aprovaram as Zonas Especiais de
Interesse Social (Zeis), que definem favelas que, por projeto de lei,
se tornam prioritárias para o investimento público.
Muitos dos problemas das cidades podem ser resolvidos se houver uma
pressão efetiva por parte das entidades da sociedade civil que se
organizam na defesa de direitos. É assim, tradicionalmente, que as
políticas mudam: por pressão. Mas é preciso ter, dentro do parlamento,
bancadas de parlamentares comprometidas com as demandas sociais e com os
movimentos de pressão por mudanças. É aí que cresce a importância do
vereador, que passa a ser um verdadeiro representante do interesse
público e dos agentes de transformação social.
Silvio Caccia Bava
Diretor e editor-chefe do Le Monde Diplomatique Brasil
Diretor e editor-chefe do Le Monde Diplomatique Brasil
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