Indústria do gás lacrimogêneo cresce alimentada por
protestos em todo o mundo. Produto começou a ser usado na década de 30 e
agora se consolida como arma repressiva “não letal” favorita. Empresa
brasileira é uma das principais fornecedoras
Em meio à crise econômica e às várias medidas de austeridade adotadas
por vários países, especialmente no Ocidente, um setor da indústria
está se dando bem: os fabricantes de gás lacrimogêneo.
Desde a Primavera Árabe (iniciada no final de 2010), o mercado de segurança interna no Oriente Médio teve um aumento de 18% em seu valor, chegando próximo aos 6 bilhões de euros (R$ 17,4 bilhões) em 2012.
Usado por forças de segurança do mundo inteiro para dispersar manifestações, as bombas de gás lacrimogêneo também tiveram destaque recente nas imagens da evacuação do Parque Gezi em Istambul no último fim de semana e da repressão aos protestos em diversas cidades brasileiras contra o aumento das tarifas de transporte público e os gastos excessivos na organização da Copa do Mundo 2014.
Egito e Tunísia estão aumentando suas compras de equipamentos para controle de distúrbios no momento em que negociam empréstimos com o FMI para cobrir seus buracos orçamentários.
Na zona do euro, afetada pela crise financeira, as coisas não são muito diferentes. O orçamento de 2012 do governo espanhol de Mariano Rajoy enfrenta cortes em praticamente todas as áreas, mas em equipamentos antidistúrbios o gasto passa de cerca de 173 mil euros a mais de 3 milhões em 2013.
Empresa brasileira é principal fornecedora de gás a governo turco. Críticos dizem que produto não pode ser chamado de ‘não letal’.
Desde a Primavera Árabe (iniciada no final de 2010), o mercado de segurança interna no Oriente Médio teve um aumento de 18% em seu valor, chegando próximo aos 6 bilhões de euros (R$ 17,4 bilhões) em 2012.
Usado por forças de segurança do mundo inteiro para dispersar manifestações, as bombas de gás lacrimogêneo também tiveram destaque recente nas imagens da evacuação do Parque Gezi em Istambul no último fim de semana e da repressão aos protestos em diversas cidades brasileiras contra o aumento das tarifas de transporte público e os gastos excessivos na organização da Copa do Mundo 2014.
Egito e Tunísia estão aumentando suas compras de equipamentos para controle de distúrbios no momento em que negociam empréstimos com o FMI para cobrir seus buracos orçamentários.
Na zona do euro, afetada pela crise financeira, as coisas não são muito diferentes. O orçamento de 2012 do governo espanhol de Mariano Rajoy enfrenta cortes em praticamente todas as áreas, mas em equipamentos antidistúrbios o gasto passa de cerca de 173 mil euros a mais de 3 milhões em 2013.
Empresa brasileira é principal fornecedora de gás a governo turco. Críticos dizem que produto não pode ser chamado de ‘não letal’.
A pesquisadora Anna Feigenbaum, que investiga a história política do
gás lacrimogêneo na Universidade de Bournemouth, na Grã-Bretanha,
acredita que a austeridade e o aumento dos gastos com segurança interna
andam de mãos dadas. “Para a indústria do gás, nada como as crises
econômico-sociais”.
A Turquia é um dos casos com mais cobertura midiática, mas um mapa (Clique veja aqui)
dos protestos no mundo onde o gás lacrimogêneo foi usado, elaborado por
Feigenbaum, mostra a expansão do mercado desde janeiro de 2013.
Como se pode ver no mapa, os protestos contidos com o uso do gás vão
desde manifestações contra o estupro de uma mulher na Índia a protestos
dos estudantes no Chile e dos professores no México, ou de trabalhadores
na França e na Espanha.
Fabricantes
A organização internacional War Resister League (Liga dos Resistentes
à Guerra, em tradução livre), que tem uma campanha específica contra o
gás lacrimogêneo, identificou a presença de empresas americanas como
Combined Systems Inc., Federal Laboratories e NonLethal Technologies da
Argentina até a Índia; de Bahrein, Egito e Israel a Alemanha, Holanda,
Camarões, Hong Kong, Tailândia e Tunísia.
A brasileira Condor Non-Lethal Technologies, uma das principais provedoras da Turquia, vende seus produtos a 41 países.
Durante a Primavera Árabe, empresas americanas exportaram 21
toneladas de munição, o equivalente a cerca de 40 mil unidades de gás
lacrimogêneo.
Em termos de manejo de protestos, nada mudou com a democratização
egípcia. Esse ano, o ministério Interior encomendou cerca de 140 mil
cartuchos de gás lacrimogêneo ao mesmo elenco de exportadoras
americanas.
Em fevereiro, o porta-voz do Departamento do Estado americano,
Patrick Ventrell, defendeu a concessão de licenças para a exportação a
essas empresas, dizendo que o gás lacrimogêneo “salva vidas e protege a
propriedade”.
A empresa brasileira Condor Non-Lethal Technologies usa argumentos semelhantes.
“As tecnologias não letais são projetadas para incapacitar
temporariamente as pessoas sem causar danos irreparáveis ou morte. Seus
efeitos são totalmente reversíveis. De acordo com uma recomendação da
ONU em 1990, a polícia tem de fazer um uso proporcional da força por
meio de armas não letais em consonância com os direitos humanos e o
respeito à vida”, disse um porta-voz da companhia à rede BBC.
A expressão “não letal” aparece no nome e marca de muitas companhias.
Mas o uso dessa expressão é contestado por especialistas e grupos
defensores de direitos humanos, que também questionam a relação próxima
entre a indústria, as forças militares e de segurança e governos, que
permitiu que o uso do produto fosse se consolidando como arma repressiva
favorita ao longo das últimas décadas.
Normalização
Na Primeira Guerra Mundial, o gás lacrimogêneo era classificado como
arma química. Mas a partir daí, entrou um cena a força do lobby
industrial-militar-governamental, como explicou Anna Feigenbaum.
“Por pressão dos governos e das corporações, mudou-se o nome de ‘arma
química’ a ‘irritante químico’ ou ‘instrumento de controle de
distúrbios’. Isso produziu uma normalização. O gás que começou a ser
usado no ‘controle de multidões’ na década de 30 se generalizou a partir
dos anos 60″, disse.
Uma pesquisa pedida pelo governo britânico sobre o uso de gás
lacrimogêneo no fim dos anos 1960 na Irlanda do Norte contribuiu de
forma particularmente significativa para essa normalização.
A investigação concluiu que não havia perigo nem para mulheres
grávidas, nem para idosos, uma afirmação duramente criticada pela
Anistia Internacional e pela ONG Médicos pelos Direitos Humanos.
Ambas as organizações sustentam que não é preciso ser mais velho ou
estar grávida para sentir efeitos “irreversíveis” dessas armas não
letais. Entre as mortes mais recentes atribuídas ao uso de gás
lacrimogêneo figuram a do adolescente Ali Al-Shiek Bahrain no ano
passado e a do palestino Mustafa Tamini no final de 2011.
“Surpreende que, ao mesmo tempo em que os Estados Unidos aprovam o
fornecimento de armas a rebeldes sírios por causa da suposta evidência
de ataques químicos ordenados pelo governo de Assad, (os Estados Unidos)
tolerem a exportação de gás lacrimogêneo. Nenhum governo deveria
aprovar ou pagar pelo uso de armas químicas”, disse Kimber Heinz, da ONG
Liga dos Resistentes à Guerra.
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