Fernando Henrique Cardoso
"O mais importante que aconteceu neste julgamento é que ficou claro que
não há crime sem castigo", comentou o ex-presidente Fernando Henrique
Cardoso sobre as discussões no STF em relação aos embargos infringentes
no processo do chamado mensalão.
Não é verdade. Nem é preciso ir longe. Sabemos todos que no Brasil há
milhares de crimes sem castigo. Basta pegar, entre outros, o do mensalão
tucano, chamado na imprensa de "mensalão mineiro", que é de 1998, mesmo
ano do caso da compra de votos para a reeleição do próprio FHC para o
segundo mandato, um caso denunciado, comprovado e logo depois esquecido
pela imprensa, sem que sequer tivesse sido aberto processo, sem falar em
práticas pouco republicanas no processo de privatização promovido pelo
governo do PSDB.
Parece que o ex-presidente não foi perguntado sobre estes assuntos, ou
simplesmente se esqueceu de tratar deles em sua análise sobre crime e
castigo.
De qualquer forma, FHC, que não é a pessoa mais indicada para julgar os
malfeitos dos outros, não perdeu a oportunidade: "Na essência, houve uma
condenação por atos malfeitos. Imagino que isso continuará pesando no
futuro", pontificou em pequena nota de pé de página publicada neste
sábado pela Folha.
Se é verdade quer a condenação por um crime ajuda a evitar que outros
sejam cometidos, pode-se também dizer que, se o mensalão tucano, sete
anos anterior ao do PT, tivesse recebido por parte da Procuradoria Geral
da República e do Supremo Tribunal Federal o mesmo tratamento
implacável e célere dado ao mensalão do PT, talvez este último nem
tivesse existido, pois o criador do valerioduto, que abasteceu as arcas
tucanas, é o mesmo instrumento que aparece na Ação Penal 470, ora em
julgamento.
E, no entanto, não há nem previsão para que o mensalão tucano entre na pauta do STF e da imprensa.
A propósito, na mesma edição da Folha, o analista jurídico Fernando
Vasconcelos lembra: "O STF desmembrou o processo do mensalão tucano, mas
negou esse direito aos réus do mensalão petista".
Foi exatamente por isso que o ministro Celso de Mello, logo no começo do
julgamento, no dia 2 de agosto, "apontou a existência dos embargos
infringentes como argumento para rejeitar um dos primeiros pedidos
feitos pelos réus, que queriam o desmembramento do processo, para que os
acusados fossem julgados na primeira instância e tivessem a opção de
recorrer ao Supremo depois", explica o jornal.
O mesmo STF, que desta vez não aceitou o desmembramento para quem não
exercia mandato eletivo, ou seja, a grande maioria dos réus, tornando-se
instância primeira e única do julgamento, dividiu-se ao analisar a
aceitação dos embargos infringentes, último recurso dos condenados.
Se Celso de Mello se mantiver fiel à sua própria palavra e pensamento, a
justiça acabará sendo feita, ainda que às custas de derrotar uma
campanha midiática sem precedentes para que os condenados
fossem mandados todos para cadeia e termine logo esta história, sem
choro nem vela.
FHC e o ministro Gilmar Mendes, que rodou a baiana na última
quinta-feira, na tentativa de acuar Celso de Mello para mudar sua
posição, já se disseram exaustos com o julgamento, mas tudo indica que
ele não terminará tão cedo. "O Supremo tem a noção de que ninguém
aguenta mais o julgamento", disse FHC, na certeza de que tão cedo não se
cansará com o julgamento do mensalão tucano.
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