Guerrilheiro Virtual

quarta-feira, 2 de outubro de 2013

Folha esconde Matarazzo e intriga ombudsman Suzana

247 – O jornal Folha de S. Paulo, "a serviço do Brasil", de acordo com seu slogan de portada, prestou na edição desta terça-feira 1º de outubro vassalagem ao sobrinho-neto do conde Francesco Matarazzo, o tucano Andrea Matarazzo.

Menos por ser o personagem ascendente sanguíneo do famoso capitão de indústrias, mas porque Matarazzo é um grão-tucano. Só pode ser isso. Ou, se não, ajudem a entender:

1 – Segundo vereador mais votado do Brasil, tucano faz tudo desde as administrações Fernando Henrique, no Brasil, e Mario Covas, em São Paulo, passando pelas de José Serra e Geraldo Alckmin, Matarazzo é frequentador contumaz das colunas sociais da mídia;

2 – Em seu partido, é uma das figuras mais poderosas;

3 – Nacionalmente é conhecido e reconhecido;

4 – Foi tesoureiro da campanha de FHC em 1998, aquela da reeleição que a Folha denunciou, na ocasião, como tendo sido feita a soldo;

5 – Foi embaixador do Brasil na Itália;

6 – Ao lado do senador Aloysio Nunes, é um serrista de quatro costados;

7 – Guarda em seu partido uma importância semelhante à do ex-tesoureiro Delúbio Soares no PT;

8 – Réu do chamado mensalão, a Ação Penal 470, Delúbio virou uma espécie de pauta permanente do jornal, com direito a destaque em títulos de primeira página e fotos em profusão;

9 – Ao ter seus sigilos bancário e fiscal quebrados pela Justiça, na segunda 30, Matarazzo não foi destaque em nenhum dos portais da mídia tradicional: Uol, Ig e G1 registraram que Justiça quebrou o sigilo de "11 suspeitos" de envolvimento no caso Alstom-Siemens, de corrupção no sistema de transportes públicos de São Paulo;

10 – Por importante e popular, o caso das quebras de sigilos vai sendo chamado pelo público de "Trem dos 11", do qual Matarazzo é o maquinista, em razão do destaque político que sempre desfrutou.

A Folha, que poderia encontrar muito mais que dez motivos para dar a notícia pelo enfoque certo – o de destacar o nome do tucano Andrea Matarazzo em seus títulos, como fez com os dos petistas José Dirceu e outros na cobertura da AP 470 -, arrumou, para ela própria, uma razão ainda maior para, como se diz no jargão jornalístico, "esconder a notícia".

Qual ter sido essa razão maior?

Será que a Folha sentou, sem querer avisar seus leitores, no colo do partidarismo e do protecionismo a certas fontes?

Abaixo, texto desta terça 1 publicado no Blog da Cidadania, do jornalista e colunista de 247 Eduardo Guimarães, sobre sua conversa, a respeito desse caso, com a ombudsman Suzana Singer.

Pelo que ficou, é de se acreditar que a profissional irá se manifestar sobre o assunto em suas próximas colunas.

Acompanhe:

Eduardo Guimarães_Colunista 247 - Na segunda-feira, 11 pessoas foram indiciadas pela Justiça federal por suspeita de terem sido corrompidas pela empresa francesa Alstom entre 1997 a 2000. Todas trabalharam em empresas controladas pelo governo paulista ou integraram esse governo à época dos fatos.

Entre os envolvidos, um nome de peso no partido que, ano que vem, completa vinte anos de governo no Estado mais rico da federação: Andreza Matarazzo, hoje vereador pelo PSDB.

O indiciamento de Matarazzo por suspeita de corrupção não tem peso somente pelo sobrenome famoso, mas pelos cargos que ocupou durante duas décadas no primeiro escalão dos governos do PSDB paulista.

O tucano graúdo foi secretário de Energia do governo de São Paulo, foi presidente da Companhia Energética de São Paulo (CESP) e do metrô. E também foi ministro de Fernando Henrique Cardoso na Secretaria de Comunicação da Presidência da República (Secom).

Também se destacou nas gestões José Serra (PSDB) e Gilberto Kassab (PSD) na prefeitura de São Paulo. Comandou as secretarias de Serviços, de Cultura e de Coordenação das Subprefeituras. Em 2008, a revista Veja o chamou de "O xerife da cidade".

Detalhe: a Justiça autorizou a Polícia Federal a usar as provas do caso Alstom no inquérito sobre pagamento de propinas pela companhia alemã Siemens e outras 18 empresas que teriam formado cartéis em licitações de trens no Estado de São Paulo entre 1998 e 2008.

As duas empresas europeias corromperam governos em vários países. Ao menos no caso da Siemens a denúncia partiu da própria empresa, cujos controles detectaram os malfeitos. Em todos esses países houve condenações de políticos envolvidos. Menos no Brasil.

Trata-se de um escândalo de proporções nacionais. Há bilhões de reais envolvidos e os acusados são figuras importantes do maior partido de oposição ao governo federal, o PSDB. Assim, esperava-se que a grande imprensa noticiasse o caso de acordo com a sua relevância.

Contudo, dos três grandes jornais de circulação nacional (Folha de São Paulo, Estadão e O Globo), só os jornais paulistas deram destaque ao assunto em suas primeiras páginas. Folha e Estadão, porém, publicaram manchetes cifradas. E o Globo publicou uma notinha nas páginas internas.

O Globo ainda poderia argumentar que o assunto é paulista e, assim, não tem relevância em um jornal do Rio de Janeiro. Seria absurdo pelos motivos supracitados, mas seria um argumento. Mas os jornais paulistas publicaram manchetes piores do que tal omissão.

Folha e Estadão publicaram manchetes de primeira página dizendo que 11 pessoas foram indiciadas no caso Alstom. Em nenhum dos jornais houve menção ao fato de que são pessoas ligadas ao PSDB e de que uma delas é um tucano de grande importância.

Inconformado, procurei a ombudsman da Folha de São Paulo, Suzana Singer, a fim de obter sua posição sobre a afasia jornalística do seu e de outros jornais em relação a esse caso. Afinal, entre suas atribuições está a de criticar não só o jornal em que trabalha, mas também outros.

Por volta das 11 horas de terça-feira 1º de outubro, deixei recado com a secretária de Suzana, na Folha, pedindo que ela me retornasse a ligação. Exatamente uma hora depois (12 horas) ela me ligou. Conversamos por quase uma hora.

Suzana foi atenciosa e paciente. Revelou saber quem sou e dos protestos e representações que fiz contra o jornal em que trabalha. E, assim mesmo, aceitou falar comigo. Devo, pois, elogiar o espírito democrático e a serenidade da ombudsman da Folha.

Fiz várias ponderações a Suzana sobre o partidarismo da imprensa e a sua postura em relação às acusações que vem recebendo da Blogosfera.

Reclamei com a ombudsman sobre acusações do seu e de outros grandes jornais e revistas a Blogs como este (Blog da Cidadania) de que seriam pagos pelo governo. E o que é pior: sem que aqueles que acusam especifiquem quem são os acusados. Disse a ela que desafio qualquer um a provar que alguém como eu já recebeu alguma coisa do governo e ela reconheceu que tais acusações são reprováveis.

Suzana também reconheceu ser absurdo que o ministro Gilmar Mendes tenha comparado blogs que teriam "pressionado" o STF aos impérios de comunicação que ela também reconheceu que tentaram pressionar aquela Corte.

Outro ponto em que a ombudsman concordou comigo foi em que não é papel da imprensa pressionar ninguém, pois seu papel é informar e não induzir quem quer que seja ou interferir nos fatos que deve se limitar a apurar e a relatar.

Manifestei minha discordância da manchete da Folha e do Estadão sobre o caso Alstom. Inicialmente, Suzana discordou porque não haveria provas contra Matarazzo nem contra os governos do PSDB.

Repliquei que há, nesse caso, um fato jornalístico: um político importante de um partido importante foi indiciado no âmbito de um escândalo envolvendo o governo tucano e esse fato foi minimizado.

Suzana treplicou que a sigla PSDB e o nome Andrea Matarazzo não estavam na manchete da Folha em sua primeira página, mas estavam na matéria a que aquela manchete remetia o leitor.

Foi então que consegui um argumento com o qual a ombudsman teve que concordar: as manchetes das primeiras páginas dos jornais são um veículo independente e todo jornalista sabe disso. Muitos só leem manchetes expostas em bancas de jornal.

Por fim, Suzana não respondeu quando lhe perguntei se achava que caso o partido e o político graúdo envolvidos fossem do PT os jornais também omitiram essa informação nas manchetes, mas tive a impressão de que concordou com a premissa de que não omitiriam.

Por fim, ponderei com a ombudsman que a imprensa brasileira não pode continuar desacreditada como está porque é uma instituição importante demais para tanto.

Lembrei que o mensalão não conseguiu interferir nas eleições do ano passado apesar de fatos espantosos como o Jornal Nacional ter tratado do assunto durante uma edição inteira, sem abordar nenhum outro assunto. E que "todos sabem" que nas vésperas de eleições sempre vem alguma denúncia de última hora da imprensa contra o PT, a tal "bala de prata".

Suzana não disse nem que sim, nem que não. Mas achei meu argumento eficiente.

Encerramos a conversa em tom amistoso e positivo. Aliás, disse-me que anotou tudo que eu lhe disse. Meu feeling me diz que irá refletir. Sobretudo por eu ter lhe dito que a radicalização política em curso no país lembra a que vi na Venezuela. E que foi causada pela mídia.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

”Sendo este um espaço democrático, os comentários aqui postados são de total responsabilidade dos seus emitentes, não representando necessariamente a opinião de seus editores. Nós, nos reservamos o direito de, dentro das limitações de tempo, resumir ou deletar os comentários que tiverem conteúdo contrário às normas éticas deste blog. Não será tolerado Insulto, difamação ou ataques pessoais. Os editores não se responsabilizam pelo conteúdo dos comentários dos leitores, mas adverte que, textos ofensivos à quem quer que seja, ou que contenham agressão, discriminação, palavrões, ou que de alguma forma incitem a violência, ou transgridam leis e normas vigentes no Brasil, serão excluídos.”