Moniz Bandeira e a Ucrânia: O alvo dos EUA é a Rússia!
Moniz Bandeira aponta aliança entre ONGs ocidentais e neonazistas na Ucrânia
Os Estados Unidos e a União Europeia
estão dispostos a se aliar não importa com quem desde que isso
enfraqueça a Rússia, diz o historiador. Marco Aurélio Weissheimer
Os protestos
de rua que vem sacudindo a Ucrânia nas últimas semanas são resultado,
em grande medida, de uma articulação bizarra entre ongs e fundações
norte-americanas e europeias e o partido neonazista Svoboda, liderado
por Oleg Tiagnibog.
Os Estados
Unidos e a União Europeia estão dispostos a se aliar não importa com
quem desde que isso enfraqueça a Rússia e permita a instalação de tropas
da OTAN na Ucrânia.
Esse é o
pano de fundo desses protestos. A avaliação é do cientista político e
historiador Luiz Alberto Moniz Bandeira, autor, entre outras obras, de A
Segunda Guerra Fria – Geopolítica e Dimensão Estratégica dos Estados
Unidos (Editora Civilização Brasileira), onde examina o papel dos
Estados Unidos na eclosão e o desenvolvimento de recentes rebeliões na
Eurásia, na África do Norte e no Oriente Médio.
Para Moniz Bandeira, os recentes acontecimentos que convulsionaram vários países no Oriente Médio, na Eurásia e norte da África devem ser entendidos no contexto da estratégia de “full spectrum dominance” (dominação de espectro total) que os EUA continuam implementando contra a presença da Rússia e da China naquelas regiões.
Para Moniz Bandeira, os recentes acontecimentos que convulsionaram vários países no Oriente Médio, na Eurásia e norte da África devem ser entendidos no contexto da estratégia de “full spectrum dominance” (dominação de espectro total) que os EUA continuam implementando contra a presença da Rússia e da China naquelas regiões.
Em
entrevista à Carta Maior, Moniz Bandeira analisa a situação da Ucrânia e
identifica os grupos que, segundo ele, estão apoiando e promovendo as
manifestações:
"ONGs, tais como Open Society Foundations [OSF], Vidrodzhenya (Reviver), Freedom House, Poland-America-Ukraine Cooperation Initiative e outras, finaciadas pelos Estados Unidos, através da USAID, National Endowment for Democracy e CIA, bem como fundações alemãs. Foram elas que promoveram a denominada Revolução Laranja, que derrubou o governo de Leonid Kuchma (1994-2005)".
"Os chamados ativistas, que instigam e lideram as demonstrações pro-Ocidente, pertencem, em larga medida, a comandos do Svoboda e de outras tendências neo-nazis, levados de Lviv (Lwow, Lemberg) para Kiev e manifestam claramente tendências xenófobas, racistas, anti-semitas e contra a Rússia".
A União Brasileira de Escritores e a Academia de Letras de Minas Gerais indicaram o nome de Moniz Bandeira para o prêmio Nobel de Literatura em 2014, cuja escolha será feita em outubro pela Academia Sueca.
Qual a sua avaliação sobre os recentes protestos que vem sacudindo a Ucrânia?
Moniz Bandeira - A Ucrânia nunca teve unidade étnica e daí a fragilidade do Estado nacional que lá se formou. Até o século XII, chamada Rus' Kievana ou Kyïvska Rus, era uma confederação de tribos eslavas orientais, virtualmente a maior potência da Europa, ao abranger a atual Bielo Rússia e parte da Rússia.
Desintegrou-se, porém, e esteve envolvida em constantes guerras entre russos, poloneses, cossacos e lituanos. Em 1795, a antiga Rus's Kievna, ao oeste do rio Dnieper, que desemboca no Mar Negro, foi repartida. A Rússia anexou a maior parte da região, todo o Kanato da Criméia, e o Império Austro-Húngaro, sob a dinastia de Habsburg, dominou a outra, incluindo a Galitzia (Halychyna), na Europa Central, até 1918.
Durante a guerra civil na Rússia, após a Revolução Bolchevique (1917), lá combateram diversas facções. Após o Exército Vermelho derrotar as forças contra-revolucionárias do general Antón Denikin e os anarquistas comandados por Nestor Makhno, a República Soviética da Ucrânia constituiu-se como Estado nacional e, em 1922, somou-se às Repúblicas Soviéticas da Rússia, Bielorrusia e Transcaucasia, na formação da União Soviética.
"ONGs, tais como Open Society Foundations [OSF], Vidrodzhenya (Reviver), Freedom House, Poland-America-Ukraine Cooperation Initiative e outras, finaciadas pelos Estados Unidos, através da USAID, National Endowment for Democracy e CIA, bem como fundações alemãs. Foram elas que promoveram a denominada Revolução Laranja, que derrubou o governo de Leonid Kuchma (1994-2005)".
"Os chamados ativistas, que instigam e lideram as demonstrações pro-Ocidente, pertencem, em larga medida, a comandos do Svoboda e de outras tendências neo-nazis, levados de Lviv (Lwow, Lemberg) para Kiev e manifestam claramente tendências xenófobas, racistas, anti-semitas e contra a Rússia".
A União Brasileira de Escritores e a Academia de Letras de Minas Gerais indicaram o nome de Moniz Bandeira para o prêmio Nobel de Literatura em 2014, cuja escolha será feita em outubro pela Academia Sueca.
Qual a sua avaliação sobre os recentes protestos que vem sacudindo a Ucrânia?
Moniz Bandeira - A Ucrânia nunca teve unidade étnica e daí a fragilidade do Estado nacional que lá se formou. Até o século XII, chamada Rus' Kievana ou Kyïvska Rus, era uma confederação de tribos eslavas orientais, virtualmente a maior potência da Europa, ao abranger a atual Bielo Rússia e parte da Rússia.
Desintegrou-se, porém, e esteve envolvida em constantes guerras entre russos, poloneses, cossacos e lituanos. Em 1795, a antiga Rus's Kievna, ao oeste do rio Dnieper, que desemboca no Mar Negro, foi repartida. A Rússia anexou a maior parte da região, todo o Kanato da Criméia, e o Império Austro-Húngaro, sob a dinastia de Habsburg, dominou a outra, incluindo a Galitzia (Halychyna), na Europa Central, até 1918.
Durante a guerra civil na Rússia, após a Revolução Bolchevique (1917), lá combateram diversas facções. Após o Exército Vermelho derrotar as forças contra-revolucionárias do general Antón Denikin e os anarquistas comandados por Nestor Makhno, a República Soviética da Ucrânia constituiu-se como Estado nacional e, em 1922, somou-se às Repúblicas Soviéticas da Rússia, Bielorrusia e Transcaucasia, na formação da União Soviética.
Após o Pacto
Molotv- Ribbentrop, ela reincorporou ao seu território a Galitzia e
Volhnia, que integravam a Polônia, bem como recebeu da Romênia a
Bessarábia, o nordeste de Bukovina e a região de Hertza.
A opressão
do regime stalinista, entre outros fatores históricos, gerou, no
entanto, forte e profundo sentimento anti-soviético e, conseqüentemente,
anti-russo. Uma parte da população não só saudou as tropas nazistas,
como libertadoras, quando invadiram a Ucrânia em 22 de junho de 1942,
como lutou ao seu lado.
Porém, a maioria incorporou-se ao Exército soviético e a brutalidade nazista reforçou ainda mais a resistência.
Em 1945, libertada, a República Soviética da Ucrânia foi um dos países fundadores da ONU, mas Stalin não conseguiu colocá-la, como membro permanente, no Conselho de Segurança. A Grã-Bretanha opôs-se. Não queria que a União Soviética com mais um voto, com direito a veto, no Conselho de Segurança. E daí que os dois países não aceitaram que o presidente Franklin D. Roosevelt, conforme prometera ao presidente Getúlio incluísse também o Brasil, porque estava então estreitamente vinculado aos Estados Unidos.
Quais são as causas e os principais protagonistas dos atuais protestos?
Moniz Bandeira - As causas das demonstrações são, sobretudo, geopolíticas e estratégicas. O que está em jogo não é, na realidade, a adesão da Ucrânia à União Européia. Não é questão de livre circulação de pessoas e de mercadorias.
Em 1945, libertada, a República Soviética da Ucrânia foi um dos países fundadores da ONU, mas Stalin não conseguiu colocá-la, como membro permanente, no Conselho de Segurança. A Grã-Bretanha opôs-se. Não queria que a União Soviética com mais um voto, com direito a veto, no Conselho de Segurança. E daí que os dois países não aceitaram que o presidente Franklin D. Roosevelt, conforme prometera ao presidente Getúlio incluísse também o Brasil, porque estava então estreitamente vinculado aos Estados Unidos.
Quais são as causas e os principais protagonistas dos atuais protestos?
Moniz Bandeira - As causas das demonstrações são, sobretudo, geopolíticas e estratégicas. O que está em jogo não é, na realidade, a adesão da Ucrânia à União Européia. Não é questão de livre circulação de pessoas e de mercadorias.
A União
Européia muito pouco pode oferecer à Ucrânia, exceto, mediante o
levantamento das barreiras alfandegárias, a importação maciça de
produtos do Ocidente, a imposição de normas europeias aos produtos que
ela fabrica e pode exportar para a mesma União Européia, o que lhe vai
dificultar ainda mais as transações comerciais.
A Ucrânia só tem a perder.
O FMI vei
impor medidas de contenção, dificultando ainda mais o desenvolvimento do
país. Muitas indústrias fecharão ou serão assenhoreadas pelas
multinacionais européias e os pequenos agricultores, arruinados pela
agro-indústria.
Porém, o que os Estados Unidos pretendem, através da incorporação da Ucrânia à União Europeia é, sobretudo, possibilitar que as forças da OTAN sejam estacionadas na fronteira da Rússia.
Porém, o que os Estados Unidos pretendem, através da incorporação da Ucrânia à União Europeia é, sobretudo, possibilitar que as forças da OTAN sejam estacionadas na fronteira da Rússia.
Conforme o
economista Paul Craig Roberts, ex-secretário assistente do Tesouro no
governo de Ronald Reagan (1981-1969), salientou, a respeito dos
comentários de Viktoria Nuland, secretária de Estado Assistente de John
Kerry, "a Ucrânia ou a parte ocidental do país está cheia de ONGs
mantidas por Washington cujo objetivo é entregar a Ucrânia às garras da
União Europeia, para que os bancos da União Europeia e dos Estados
Unidos possam saquear o país como saquearam, por exemplo, a Latvia; e
enfraquecer, simultaneamente, a Rússia, roubando-lhe uma parte
tradicional e convertendo-a em área reservada para bases militares de
Estados Unidos-OTAN".
Com efeito,
por trás das ininterruptas demonstrações, das quais dois senadores
americanos -John McCain (Partido Republicano) e Christopher Murphy
(Partido Democrata) abertamente participaram - estão certas ONGs, tais
como Open Society Foundations [OSF], Vidrodzhenya (Reviver), Freedom
House, Poland-America-Ukraine Cooperation Initiative e outras,
finaciadas pelos Estados Unidos, através da USAID, National Endowment
for Democracy e CIA, bem como fundações alemãs. Foram elas que
promoveram a denominada Revolução Laranja, que derrubou o governo de
Leonid Kuchma (1994-2005).
Essas e outras organizações não governamentais foram criadas como fachada para promover a política de mudança de regime sem golpe de Estado. Esse novo método de subversão, que os Estados Unidos desenvolveram, demonstro, com vasta documentação, em meu livro A Segunda Guerra Fria - Das rebeliões na Eurásia à África do Norte e ao Oriente Médio, lançado em 2013.
E como está a situação hoje da Ucrânia? Para onde caminha o país?
Moniz Bandeira - A Ucrânia está em uma situação econômica e social extremamente difícil. O desemprego, segundo o governo, é da ordem de 8% e parcela significativa da população - de 25%, conforme as estatísticas oficiais -, vive abaixo da linha de pobreza.
Essas e outras organizações não governamentais foram criadas como fachada para promover a política de mudança de regime sem golpe de Estado. Esse novo método de subversão, que os Estados Unidos desenvolveram, demonstro, com vasta documentação, em meu livro A Segunda Guerra Fria - Das rebeliões na Eurásia à África do Norte e ao Oriente Médio, lançado em 2013.
E como está a situação hoje da Ucrânia? Para onde caminha o país?
Moniz Bandeira - A Ucrânia está em uma situação econômica e social extremamente difícil. O desemprego, segundo o governo, é da ordem de 8% e parcela significativa da população - de 25%, conforme as estatísticas oficiais -, vive abaixo da linha de pobreza.
O índice de
desnutrição é estimado entre 2 e 3 % até 16%. O salário médio é de US$
332,00, um dos mais baixos da Europa. As áreas rurais, no Ocidente, são
mais pobres. E a Ucrânia está na iminência de praticar o default. Os
jovens ucranianos, porém, imaginam que a União Européia pode melhorar
seu standard de vida e aumentar prosperidade do país. Os ucranianos – em
primeiro lugar a juventude – têm o sonho da UE, a liberdade de viajar,
as ilusões de conforto, bons salários, prosperidade, etc. Sonhos com os
quais os governos ocidentais contam para derrubar o governo de Vikton
Yanukovych.
Qual a importância geopolítica da Ucrânia hoje no cenário europeu e internacional?
Moniz Bandeira - Zbigniew Brzezinski, ex-assessor de Segurança Nacional do presidente Jimmy Carter, escreveu certa vez que, no novo tabuleiro do xadrez mundial, “a Ucrânia podia estar na Europa sem a Rússia, porém a Rússia não podia estar na Europa sem a Ucrânia".
Qual a importância geopolítica da Ucrânia hoje no cenário europeu e internacional?
Moniz Bandeira - Zbigniew Brzezinski, ex-assessor de Segurança Nacional do presidente Jimmy Carter, escreveu certa vez que, no novo tabuleiro do xadrez mundial, “a Ucrânia podia estar na Europa sem a Rússia, porém a Rússia não podia estar na Europa sem a Ucrânia".
A equação, contudo, é muito mais complexa.
A Ucrânia,
chamada, tradicionalmente, de "pequena Rússia", não pode se desprender
da Rússia, da qual muito depende, sobretuido para seu abastecimento de
gás. E sua adesão à União Européia, permitindo o avanço da OTAN até a
fronteiras da Rússia, tenderia evidentemente a romper todo o equilíbrio
geopolítico da Eurásia, uma vasta região terrestre e fluvial, até o
Oriente Médio, devido abranger os importantes estreitos de Bósforo e
Dardanelos, que possibilitam as comunicações do Mar Negro e de
importantes zonas energéticas (gás e petróleo) com o Mar Mediterrâneo,
cujo controle e completo domínio os Estados Unidos buscam com a
derrubada do governo de Basshar al-Assad, na Síria.
A questão da Ucrânia insere-se, assim, no mesmo contexto da guerra na Síria.
A questão da Ucrânia insere-se, assim, no mesmo contexto da guerra na Síria.
A Rússia
ainda mantém importante base naval na Síria, em Tartus, bem como
conserva forças no porto de Latakia. E, não obstante o colapso da União
Soviética, continuou a configurar, na percepção dos Estados Unidos, como
seu maior rival.
Ao Ocidente
- Estados Unidos e União Européia - não interessa, portanto, a criação
da União Econômica Eurasiana, cujo tratado o presidente da Rússia,
Vladimir Putin, o grande estadista da atualidade, está a negociar com as
antigas repúblicas que antes integraram a extinta União Soviética, tais
como Quirguistão, Armênia, Bielorrússia, Cazaquistão e Ucrânia, exceto
os países bálticos.
Os Estados
Unidos e a União Européia entendem que a Rússia voltaria, assim, a
conquistar dimensão estratégica e geopolítica na mesma proporção da
extinta União Soviética. O que está em jogo não é questão ideológica. É
geoestratégica.
Como disse, Washington nunca deixou de perceber a Rússia como seu principal adversário, mesmo após a dissolução da União Soviética (1991).
Como disse, Washington nunca deixou de perceber a Rússia como seu principal adversário, mesmo após a dissolução da União Soviética (1991).
Em 1991, o
general Colin Powell, então chefe do Estado-Maior Conjunto das Forças
Armadas, no governo de George H. W. Bush (1989-1993), recomendou que os
Estados Unidos impedissem que a União Europeia se tornasse uma potência
militar, fora da OTAN, a remilitarização do Japão e da Rússia, bem como
desencorajasse qualquer desafio à sua preponderância ou tentativa de
reverter a ordem econômica e política internacionalmente estabelecida.
Também Dick
Cheney, então como secretário de Defesa, divulgou, em 1992, um documento
no qual estabeleceu que a primeira missão política e militar dos
Estados Unidos consistia em impedir o surgimento de algum poder rival na
Europa, na Ásia e na extinta União Soviética.
Qual é a atual correlação de forças interna na Ucrânia no que diz respeito aos protestos?
Moniz Bandeira - O eixo da crise não está propriamente na correlação de forças domésticas, i. e., dentro da Ucrânia. Grande parte da população não apoia os que fazem demonstrações em Kiev. E o país, quer queiram ou não os manifestantes, está na órbita de gravitação da Rússia.
Qual é a atual correlação de forças interna na Ucrânia no que diz respeito aos protestos?
Moniz Bandeira - O eixo da crise não está propriamente na correlação de forças domésticas, i. e., dentro da Ucrânia. Grande parte da população não apoia os que fazem demonstrações em Kiev. E o país, quer queiram ou não os manifestantes, está na órbita de gravitação da Rússia.
Por outro
lado, o Mar Negro é controlado, desde o reinado de Catarina, a Grande
(1762 e 1796), pela frota russa, baseada na península da Crimeia, com a
base naval em Sebastobol e mais um porto em Odessa.
A Rússia
jamais pode aceitar a incorporação da Ucrânia à OTAN, mesmo que a
associação com a União Européia não implique aliança
política-estratégica.
O presidente
Vladimir Putin, diplomaticamente, já fez a advertência de que está
muito preocupado com a dívida do gás que a Rússia fornece a Ucrânia não
paga. E se cortar o fornecimento o governo, que os Estados Unidos querem
impor, não se sustenta. Cai.
Viktor Yushchenko, quando foi levado à presidência da Ucrânia, era a favor do Ocidente, porém, tal como seu antecessor Leonid Kuchma, que solicitara a adesão da Ucrânia à OTAN, na reunião de Raykjavia (13 de maio,2002), teve de rever sua posição, diante da realidade geopolítica. Cairia, decerto, se consumasse a adesão à OTAN.
Viktor Yushchenko, quando foi levado à presidência da Ucrânia, era a favor do Ocidente, porém, tal como seu antecessor Leonid Kuchma, que solicitara a adesão da Ucrânia à OTAN, na reunião de Raykjavia (13 de maio,2002), teve de rever sua posição, diante da realidade geopolítica. Cairia, decerto, se consumasse a adesão à OTAN.
A União Europeia, outrossim, depende mais da Rússia que a Rússia da União Européia.
E essa foi
uma das razões pela quais se recusou a alinhar-se com os Estados Unidos
para aplicar sanções contra o governo de Viktor Yushchenko.
Acabei de receber de um conhecido em Kiev essa mensagem, que bem confirma e demonstra o quanto a mídia manipula as informações sobre os acontecimentos na Ucrânia:
“Sim, efetivamente aqui está muito quente na rua (a temperatura chegou a 35 graus negativos na semana passada). Eu fui ver as barricadas ontem à noite, na primeira linha diante dos integrantes da polícia militar. É bastante impressionante. Os opositores na rua que ocupam aquela área estão armados, muito bem organizados militarmente em companhias, fazem patrulhas em grupos de combate de dez pessoas, com capacetes e armas. Eu cruzei com dois sujeitos com uniformes da divisão SS Galicia (que lutou com os alemães contra os soviéticos em 1943-1945. Acho muito engraçado ver os políticos europeus fazendo grandes declarações sobre o “Maidan” e a democracia quando praticamente todos esses tipos que enfrentam a polícia nas ruas são fascistas. É uma grande hipocrisia. Os euro-atlânticos estão prontos a se aliar com não importa quem (como os islamistas na Síria) desde que isso contribua para enfraquecer a Rússia”.
Qual a estrutura política de fato da oposição ucraniana?
Moniz Bandeira - Na 50ª Conferência de Segurança de Munique, o secretário de Estado, John Kerry, disse que as demonstrações contra Yushchenko, em Kiev, tinham como objetivo implantar a democracia. Que democracia? Viktor Yushchenko fora democraticamente eleito em 2010.
O
nacionalismo ressurgente na Ucrânia e alimentado pelo Ocidente é, na
realidade, um neo-nazismo. O partido que o fomenta é o Svoboda, cujo
chefe é Oleg Tiagnibog, com maior influência no leste da Galitzia, antes
pertencente à Polônia e onde muitos habitantes colaboraram com as
tropas da Wehmarcht e formaram a 14. Waffen-Grenadier-Division der SS,
sobretudo na Galitzia oriental, reduto da extrema-direita.
Os chamados
ativistas, que instigam e lideram as demonstrações pro-Ocidente,
pertencem, em larga medida, a comandos do Svoboda e de outras tendências
neo-nazis, levados de Lviv (Lwow, Lemberg) para Kiev e manifestam
claramente tendências xenófobas, racistas, anti-semitas e contra a
Rússia.
Os manifestantes que estão nas ruas têm o apoio da maioria da população?
Moniz Bandeira - Creio que não. O Partido das Regiões, liderado pelo presidente Viktor Yanukovich representa, provavelmente, a grande parte da população, sobretudo no oriente e no sul, bem como conta com forte apoio oeste, i. e., na Ucrânia sub-carpática.
Os manifestantes que estão nas ruas têm o apoio da maioria da população?
Moniz Bandeira - Creio que não. O Partido das Regiões, liderado pelo presidente Viktor Yanukovich representa, provavelmente, a grande parte da população, sobretudo no oriente e no sul, bem como conta com forte apoio oeste, i. e., na Ucrânia sub-carpática.
Seu suporte,
portante, é grande, tanto que triunfou nas eleições em 2010. E o
projeto do presidente Vladimir Putin fortalece ainda mais os vínculos da
parte oriental da Ucrânia, mais industrializada, com a Rússia, mediante
a cooperação industrial, modernização e integração de tecnologias,
como antes se realizava com a União Soviética, nas áreas da aeronáutica,
produção de satélites, armamento, construção naval e outras. Na parte
ocidental o idioma que predomina é o ucraniano
Que lhe pareceu a expressão de desprezo pela União Européia (“Fuck the EU” ), dita pela secretária de Estado Assistente, Viktoria Nuland, na conversa com o enviado especial dos Estados Unidos à Ucrânia, embaixador Geoffrey Pyatt?
Moniz Bandeira - Não me surpreendeu. Viktoria Nuland apenas expressou o que sempre pensaram e pensam as autoridades de Washington com respeito não apenas à União Européia, mas também ao resto do mundo.
Que lhe pareceu a expressão de desprezo pela União Européia (“Fuck the EU” ), dita pela secretária de Estado Assistente, Viktoria Nuland, na conversa com o enviado especial dos Estados Unidos à Ucrânia, embaixador Geoffrey Pyatt?
Moniz Bandeira - Não me surpreendeu. Viktoria Nuland apenas expressou o que sempre pensaram e pensam as autoridades de Washington com respeito não apenas à União Européia, mas também ao resto do mundo.
A
manifestação do extremo egoismo é nacional, a que o embaixador do
Brasil, Domício da Gama, notara e escreveu ao Itamaraty, por volta de
1912. O vazamento dessa conversa, por telefone, de Viktoria Nuland com o
embaixador Geoffrey Pyatt, sobre quem Washington deve escolher para
assumir a presidência da Ucrânia, não vai provavelmente modificar a
intenção de Washington com respeito à Ucrânia.
A posição de
Washington não é muito forte. Victória Nuland, irritada, demonstrou-o
ao exclamar “Fuck the EU” diante da hesitação da Europa de arriscar sua
existência em benefício da hegemonia dos Estados Unidos e não alinhar-se
ao projeto de sanções contra o governo de Viktor Yanukovich.
A União Europeia e os Estados Unidos têm condições de enfrentar a Rússia para resgatar a Ucrânia do colapso financeiro?
Moniz Bandeira - Quase nenhuma. O povo na Alemanha, o país com mais recursos e sobre o qual recai a maior responsabilidade pelo resgate, não aguenta mais amparar financeiramente os diversos países, membros da União, a fim de que não quebrem.
A União Europeia e os Estados Unidos têm condições de enfrentar a Rússia para resgatar a Ucrânia do colapso financeiro?
Moniz Bandeira - Quase nenhuma. O povo na Alemanha, o país com mais recursos e sobre o qual recai a maior responsabilidade pelo resgate, não aguenta mais amparar financeiramente os diversos países, membros da União, a fim de que não quebrem.
Continuam
todos altamente endividados e praticamente não aparecem maiores sinais
de recuperação econômica. A quase estagnação é um fato.
E o problema
da dívida pública dos Estados Unidos, a depender sempre de que o
Congresso aumente o seu limite, não permite, decerto, ao governo do
presidente Barack Obama atender à situação catastrófica da Ucrânia.
Entretanto, a
economia da Rússia, desde o ano 2000, cresceu em média 7%, tornou-se a
sétima economia mundial segundo o método da paridade do poder de compra e
ainda ajudou a União Europeia com a construção de oleodutos e gasodutos
subterrâneos, que passam através da Ucrânia e outros países aos quais
fornece grande parte da energia. Cerca de 60% do gás que a Alemanha
consome provém da Rússia.
E o
presidente Vladimir Putin já forneceu ao governo de Viktor Yanukovich um
bailout de US$ 17 bilhões, ademais de reduzir por algum tempo o preço
do gás que fornece ao país. Mas se cobrar a dívida, a Ucrânia quebra.
Há quem veja uma conexão entre as mobilizações de rua que vêm ocorrendo em vários países nos últimos anos? O senhor vê tal conexão?
Moniz Bandeira - Diversos e complexos fatores, tais como a crise financeira mundial, iniciada em 2007/2008, a estagnação econômica, desemprego dos jovens, desencanto com os governos, bem como outros fatores domésticos e o fenômeno do contágio e mimetismo, concorreram para que agentes externos pudessem fomentar as demonstrações ocorridas em diversos países, sobretudo na Eurásia e no Oriente Médio.
Há quem veja uma conexão entre as mobilizações de rua que vêm ocorrendo em vários países nos últimos anos? O senhor vê tal conexão?
Moniz Bandeira - Diversos e complexos fatores, tais como a crise financeira mundial, iniciada em 2007/2008, a estagnação econômica, desemprego dos jovens, desencanto com os governos, bem como outros fatores domésticos e o fenômeno do contágio e mimetismo, concorreram para que agentes externos pudessem fomentar as demonstrações ocorridas em diversos países, sobretudo na Eurásia e no Oriente Médio.
Como
demonstro, documentadamente, em meu livro A Segunda Guerra Fria, logo
após os atentados contra as torres gêmeas do World Trade Center, em 11
de setembro de 2001, o presidente George W. Bush (2001-2009), ao mesmo
tempo em que deflagrou a War on Terror, a guerra sem fim, estabeleceu a
“freedom agenda” e autorizou o Departamento de Estado a criar a Middle
East Partnership Initiative (MEPI) com o propósito de treinar ativistas
políticos, com base no From Dictatorship to Democracy, do professor Gene Sharp, usado na Sérvia, na Ucrânia, na Geórgia e em outros países.
O objetivo era treinar e encorajar dissidentes e "reformistas democráticos!, sob os “regimes repressivos” no Irã, na Síria, na Coreia do Norte e na Venezuela, entre muitos outros, a solapar a estabilidade e a força econômica, política e militar de um Estado sem recorrer ao uso da insurreição armada ou de golpe militar, mas provocando violentas medidas, a serem denunciadas como emprego de força brutal, abuso dos direitos humanos etc. e provocar o descrédito do governo.
O objetivo era treinar e encorajar dissidentes e "reformistas democráticos!, sob os “regimes repressivos” no Irã, na Síria, na Coreia do Norte e na Venezuela, entre muitos outros, a solapar a estabilidade e a força econômica, política e militar de um Estado sem recorrer ao uso da insurreição armada ou de golpe militar, mas provocando violentas medidas, a serem denunciadas como emprego de força brutal, abuso dos direitos humanos etc. e provocar o descrédito do governo.
A estratégia
do professor Gene Sharp consiste na luta não violenta, porém complexa,
travada por vários meios, como protestos, greves, não cooperação,
deslealdade, boicotes, marchas, desfiles de automóveis, procissões etc.,
em meio à guerra psicológica, social, econômica e política, visando à
subversão da ordem.
Ela serviu
para promover as chamadas “revoluções coloridas”, na Eurásia, e a
"primavera árabe", na África do Norte e Oriente Médio. E ONGs,
finaciadas pela Now Endowment for Democracia (NED), USAID e CIA e
outras instituições públicas e privadas, foram e são nada menos que a
mão invisível Washington.
Daí a secretária de Estado Assistente, Victoria Nuland, ter declarado na conversa com o embaixador Geoffrey Pyatt que, nas duas últimas décadas, os Estados Unidos gastaram US$ 5 bilhões para a "democratização" da Ucrânia, i. e., para subverter os regimes, cortar seus laços históricos com a Rússia e integrá-lo na sua esfera de influência, via União Européia.
Daí a secretária de Estado Assistente, Victoria Nuland, ter declarado na conversa com o embaixador Geoffrey Pyatt que, nas duas últimas décadas, os Estados Unidos gastaram US$ 5 bilhões para a "democratização" da Ucrânia, i. e., para subverter os regimes, cortar seus laços históricos com a Rússia e integrá-lo na sua esfera de influência, via União Européia.
Victoria
Nuland é esposa de Robert Kagan, líder dos neoconservadores (neo-cons)
do ex-presidente George W. Bush, cujo papel como "universal soldier", o presidente Barack Obama passou a desempenhar.
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