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domingo, 7 de agosto de 2011

Ícone de direita dos EUA aumentou gastos na crise dos anos 80

Evocar Ronald Reagan (1911-2004) é o grande clichê do debate da dívida americana -- tanto pré-pacote fiscal, quando o medo era um calote, quanto hoje, quando se teme a recessão. Nem Reagan, porém, encolheu tanto o Estado como o atual movimento conservador defende.

O ex-presidente republicano -- que deu nome a um modelo de governo fiscalmente enxuto e socialmente conservador -- chegou a gastar 23,5% do PIB no auge da crise do início dos anos 80.

Associated Press/Efe
O ex-presidente norte-americano Ronald Reagan (à esq.) e o atual presidente, Barack Obama
O ex-presidente norte-americano Ronald Reagan (à esq.) e o atual presidente, Barack Obama

É mais do que qualquer outro presidente pós-Segunda Guerra e próximo dos gastos do governo Barack Obama em 2009 e 2010, quando o democrata foi obrigado a socorrer instituições financeiras.

"Boa parte do movimento conservador e o partido republicano hoje se moveram significativamente à direita de Reagan", disse a Folha Alexander Keyssar, historiador em Harvard.

Foi essa transição gradual, iniciada nos anos 1970, que pariu neste século o Tea Party, grupo que obstruiu a elevação do teto da dívida em nome do combate ao gasto público e aos impostos.

Na encarnação original, o movimento conservador se apoiou em mudanças socioeconômicas e numa bem articulada batalha ideológica, alimentada pelo clima de mal-estar que tomava o país: derrota no Vietnã, impeachment de Richard Nixon e surtos recessivos com choques do petróleo em 1973 e 1979.
A disseminar suas ideias estava uma rede de novos centros de estudos, entre eles a Fundação Heritage (1973) e o Cato Institute (1977), até hoje influentes na política e no embate retórico.

Essa onda impulsionou a eleição, em 1980, de Reagan. O republicano, contudo, é visto como moderado diante da atual bancada do partido no Congresso -- embora esta o evoque como padrinho.

Eleito aos 69 anos, Reagan "era velho o suficiente para ter memória da Grande Depressão dos anos 30 e do papel central que o governo tinha a desempenhar", afirma Keyssar.

CORTES PARA RICOS

Sem reduzir significativamente a carga tributária, Reagan de fato a tornou menos progressiva, cortando impostos dos mais ricos e de empresas, alegando que isso beneficiaria, na forma de investimentos, camadas menos afluentes -- lógica evocada por Bush filho em 2001.

Ao mesmo tempo, porém, aumentou o gasto público para conter a recessão (quedas do PIB de 0,3% em 1980 e 1,9% em 1982) e para relançar a corrida armamentista contra a União Soviética.

Sob Reagan, o deficit orçamentário foi a 6% em 1983, outro recorde em 37 anos (hoje está em quase 9%). Além disso, sua agenda inicial acabou matizada pela falta de maioria na Câmara dos Deputados, dominada na época pelos democratas.

Embora tenha chegado, em sua carreira pregressa em Hollywood, a presidir o sindicato dos atores, Reagan deixou na esquerda o trauma de derrotar a greve dos controladores de voo, em 1981.

Estudiosos como Joseph McCartin, da Universidade de Georgetown, afirmam que o episódio contribuiu para acentuar a queda da sindicalização nos EUA, provocada também pela diminuição do emprego industrial.

A proporção de sindicalizados entre os trabalhadores foi de 20,1% em 1983 para 11,9% -- redução associada a estagnação da renda familiar e concentração da riqueza. Em 2008, a concentração foi a níveis pré-New Deal (plano anticrise dos anos 30), com o 0,1% no topo acumulando 10,4% da riqueza, quatro vezes mais do que há 40 anos.

O resultado foi a bolha de crédito podre que estourou com a falência do banco Lehman Brothers, como explica o economista Robert Wade, da London School of Economics: "A tendência de subconsumo foi contrabalançada por uma grande expansão do crédito, gestada pelos sistemas financeiros doméstico e internacional".

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