Na última eleição presidencial, o PSDB, pela sua campanha reacionária e desprovida de propostas consistentes, condenou-se a um fracasso humilhante nas urnas. A dupla PSDB/DEM, diante disso, a cada dia teve que encarar a repercussão negativa de suas gafes e das trapalhadas de seus envolvidos diretos, sobretudo o próprio candidato José Serra.
Os incidentes se deram de tal forma que os dois partidos passaram a sofrer uma crise interna, causando a debandada de vários de seus integrantes, alguns fundadores do PSDB, outros herdeiros de todo um DNA político que surgiu da antiga UDN ao recente DEM, para fora dos dois partidos e vários deles para o "ressuscitado" PSD, que, sabemos, não será na prática o partido de nomes como Juscelino Kubitschek, Tancredo Neves, Benedito Valadares, Antônio Balbino e Ernâni do Amaral Peixoto.
E o que ocorreu, afinal, com essa crise política toda que isolou o PSDB, o DEM e seu satélite político, o PPS? Simplesmente desgastou seriamente o antigo establishment da direita brasileira, a "direitona" política que, ranzinza, não consegue sequer mentir para o povo.
Com isso, a direitona política teve que recorrer à grande imprensa associada. Há muito esta era considerada o "partido político do capital", algo que uma espécie de versão compacta do antigo "instituto" IPES, a "frente ampla" da direita que pediu o golpe militar de 1964.
No entanto, a maior parte da opinião pública apenas reconhecia o direitismo jornalístico em alguns personagens e instituições. Mas, nos últimos anos, ao reacionarismo explícito de alguns meios de comunicação, além da RBS e Rede Bahia, somou-se também o surto reacionário antes implícito porém bem mais feroz da Isto É, Bandeirantes, Rádio Metrópole, Diários Associados e outros totens do segundo time da grande mídia conservadora.
Ver um ataque aos garis surgir não das páginas de Veja, como seria o esperado, mas na tela de uma TV Bandeirantes que fazia parcerias com Carta Capital e enviava anúncios publicitários de seu braço radiofônico noticioso para a mesma e para Caros Amigos foi um choque.
Muitos que acreditavam que os concorrentes diretos da mídia abertamente reacionária seriam necessariamente aliados. Faltou-lhes a leitura previdente de Memórias do Escrivão Isaías Caminha, que Lima Barreto lançou há um século, e que nos prevenia de uma grande mídia "boazinha" que, metida a rebelde, não tardava a se mostrar alinhada aos poderosos. Foi como colocar um filhote de raposa num galinheiro e esperar o tempo passar.
E agora, quando as críticas à grande imprensa começam a crescer e os escândalos que no exterior envolvem o magnata Rupert Murdoch, nem a "mídia boazinha" escapa. Luta-se pela regulação da mídia até mesmo em Salvador, depois que muitos deixaram de acreditar que a melhor solução para a mídia é deixar o galinheiro sob os cuidados da raposa Mário Kertèsz. E ninguém mais sonha feito criança inocente em ver a Isto É figurando lado a lado com a mídia esquerdista.
Só que o desgaste que envolve a Rede Globo e alguns jornais de São Paulo e, acima de tudo, a Veja, pode fazer com que a direita brasileira tenha que apostar em mais uma carta na mão, na medida em que demotucanos e sua imprensa imprestável entram em falência.
E que carta é essa que a direita têm em suas mãos? Ou melhor, que atua sem estar exatamente em suas mãos?
É a cultura de centro-direita, que promove a pseudo-cultura "popular" e midiática como se fosse "cultura das periferias". Essa pseudo-cultura tem o mesmo gosto de mídia podre dos artigos "porcos" de "calunistas" e "urubólogas", mas que diabos a defesa da mesma é aberta e até chorosamente feita por intelectuais de esquerda é algo que só a boa-fé destes e seus preconceitos de classe média semi-abastada que estes possuem pode explicar.
Pois é essa pseudo-cultura de funqueiros, breganejos, sambregas, tecnobregas, "bregas de raiz", popozudas, "jornalistas" policialescos, imprensa "popular" e outros engodos que será a nova cartada da mídia reacionária. Uma pseudo-cultura que trata o povo pobre como um "coitadinho", forçando-lhe a inferioridade social enrustida, o papel de "bobo da corte" da pequena burguesia, com relativo direito ao consumismo, mas sem qualquer direito para a cidadania de fato.
A centro-direita cultural até está conseguindo vencer a esquerda pelo papo, criando dramalhões que legitimam a mediocridade cultural dominante. "Fulano é coitadinho, é vítima de preconceito", é uma de suas falácias certeiras.
E isso é muito perigoso, porque toda a verborragia da centro-direita cultural, dotada de muita visibilidade e de um status praticamente divinizado pela intelectualidade em geral, ganha sentido e qualquer questionamento feito é rebatido com as mesmas ladainhas de "preconceito", "elitismo" e "moralismo" que a centro-direita cultural, que se acha "esquerdista", atribui a seus contestadores.
A centro-direita cultural tenta empastelar o que o povo brasileiro tem de mais caro, sua cultura, suas crenças, seus hábitos e sua arte, com uma gororoba de valores pseudo-culturais "livres", "universais" e "democráticos" lançada pela TV aberta e patrocinada pelos mesmos barões da grande mídia que só ficam rindo quando a intelectualidade tenta negar o mais do que óbvio vínculo do brega-popularesco com a mídia reacionária.
A direita, querendo manter seus privilégios, lançará novas armadilhas, talvez mais sutis. E cabe à intelectualidade realmente esquerdista, em vez de admirar o queijo, que preste mais atenção à ratoeira.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
”Sendo este um espaço democrático, os comentários aqui postados são de total responsabilidade dos seus emitentes, não representando necessariamente a opinião de seus editores. Nós, nos reservamos o direito de, dentro das limitações de tempo, resumir ou deletar os comentários que tiverem conteúdo contrário às normas éticas deste blog. Não será tolerado Insulto, difamação ou ataques pessoais. Os editores não se responsabilizam pelo conteúdo dos comentários dos leitores, mas adverte que, textos ofensivos à quem quer que seja, ou que contenham agressão, discriminação, palavrões, ou que de alguma forma incitem a violência, ou transgridam leis e normas vigentes no Brasil, serão excluídos.”