Luiz Eça
Os EUA e a Europa Unida ameaçam endurecer as sanções contra o Irã de uma maneira tal que poderia causar terríveis danos não só à economia iraniana, como também às deles. Proibir nações de importarem petróleo do Irã, sob pena de não poderem mais fazer transações com os americanos e europeus, é uma arma de dois gumes.
Isso significaria, de imediato, redução da oferta de petróleo no mercado internacional, com a elevação conseqüente do seu preço às alturas. O Irã perderia receitas essenciais à sua economia, mas os EUA e a Europa, que já estão em crise, ficariam em situação ainda mais difícil com esse brusco aumento em suas despesas de importação.
Ontem, 27 de dezembro, o Irã já ameaçou fechar o estreito de Ormuz, por onde passa 1/3 de todo petróleo consumido no mundo, caso a ameaça ocidental se concretize. “Se o petróleo do Irã for banido nem uma simples gota de petróleo passará através do estreito de Ormuz”, contra atacou verbalmente o Vice-Presidente Mohammad Reza Rahimi.
Embora, possivelmente, os EUA, de qualquer modo, carregariam nas sanções para agradar Israel, agora que as eleições estão próximas se a temporada de caça ao financiamento e ao voto do judeu americano já começou, os europeus , certamente, não se lançariam nessa lance suicida se não fosse o último relatório da Agência Internacional de Energia Atômica (IAEA), da ONU.
Esse relatório, como se sabe, afirmava que o Irã estava mesmo embalado num programa de produção de armas nucleares, baseado numa série de fatos. Não vou analisar agora se esses fatos autorizavam ou não essa conclusão. Para os russos, chineses e umas série de cientistas nucleares isso não acontecia, mas a Europa e os EUA, através dos seus chefes de governo, fizeram fé no relatório. Uns por se sentirem ameaçados por um Irã possivelmente nuclear e outros por uma possível derrota eleitoral em 2012, anunciaram aquelas sanções destrutivas. Como não são loucos, todos eles estão analisando como aplicá-las sem que se voltem contra eles.
Seja como for, está claro que sem o relatório, essa situação não seria criada. Ele mostra muitas fotos que são, na verdade, pouco esclarecedoras. As conclusões condenatórias do Irã baseiam-se em parte nestas fotos, mas muito mais na interpretação que delas faz Yuliyo Amano, o Diretor Geral da Agência Internacional de Energia Atômica(IAEA).
Avançando mais um pouco: a credibilidade do Sr. Amano é um dado fundamental na questão. Infelizmente, os fatos demonstram que Amano não é digno, digamos, de uma confiança que depositaríamos num cão de guarda.
Esss dúvidas surgiram por causa de alguns telegramas revelados pelo Wiki Leaks.
Foram enviados em 2009 pelo embaixador americano Geoffrey Pyatt, de Viena, a sede da Agência Internacional de Energia Atômica (IAEA).
O primeiro data de 9 de junho desse ano. O embaixador Pyatt informa que Amano agradece aos EUA, França e Austrália pelo seu apoio à sua eleição a Diretor Geral da IAEA. Destaca como decisiva a intervenção americana ao cabalar o voto argentino.
Mal começo, portanto. É difícil ser imparcial com relação aos interesses de quem você deve sua eleição. E os EUA tinham no tempo do antecessor de Amano, El Baradei (prêmio Nobel da Paz), feito tudo para convencer o mundo que o programa nuclear iraniano era militar, como seu “aliado especial”Israel garantia e o hostil governo de Teerã negava.
Bem, Amano não se fez de difícil. Nesse mesmo telegrama, o embaixador americano informava que Amano havia discutido com ele como reestruturar o nível mais elevado da IAEA, incluindo a demissão de um profissional top e a manutenção de um outro. “Concordamos com Amano quanto a esses dois profissionais e vimos essa decisão como um bom sinal,” concluiu, judiciosamente, Pyatt.
No mesmo telegrama, Pyatt disse que deixou claro a Amano que poderia contar com forte apoio financeiro dos EUA para que sua gestão na IAEA fosse bem sucedida. Acrescentou que, logo após sua posse, Amano consultou o embaixador de Israel Michaeli, e que este mostrou total confiança na prioridade que Amano daria às fiscalizações das instalações nucleares iranianas.
É estranha tanta consideração uma vez que Israel não é membro da IAEA, tem um programa militar nuclear secreto e recusa-se a permitir que seja fiscalizado por inspetores da IAEA.
Surpresa maior é o que Amano teria confidenciado ao embaixador de Israel: ele havia explicado que afirmara não ter provas de existir um programa nuclear militar iraniano para pode persuadir da sua imparcialidade aqueles que não haviam apoiado sua indicação para Diretor Geral.
Indo mais adiante, Pyatt comentou que, particularmente, Amano agradeceu às consultas feitas ao Chefe da Comissão de Energia Atômica de Israel. Ou seja, consultou os maiores adversários e acusadores do Irã. Será que ele esperava informações objetivas e imparciais?
Em outro telegrama, esse de 16 de outubro de 2009, a representação americana em Viena informa que Amano esforçou-se bastante para enfatizar seu apoio aos objetivos estratégicos dos EUA para a Agência. Lembrou ao embaixador (Glyn Davies), em várias ocasiões, que ele estava fortemente ao lado dos EUA em cada decisão estratégica chave, desde indicações de pessoal de alto nível até a condução do problema do alegado programa militar nuclear iraniano.
Falado francamente, Amano mostrou ainda a importância de manter uma certa “ambigüidade construtiva” quanto a seus planos. Pelo menos até ele tomar posse na Direção geral da IAEA, substituindo El Baradei, em dezembro de 2009.
Lembramos ainda outros fatos obscuros como o vazamento para diplomatas ocidentais dos pontos principais do relatório, antes de sua apresentação à reunião dos Governadores da IAEA. E a visita que Amano fez à Casa Branca, supostamente para mostrar em primeira mão o relatório a seus aliados , os sobrinhos de Tio Sam.
Esses fatos foram tornados públicos, sendo, portanto, do conhecimento dos representantes de todas as nações membros do IAEA. Surpreendentemente, apenas o Irã, principal vítima, reclamou o afastamento de Amano. A Rússia e a China, que são contra novas sanções limitaram-se a criticar o relatório e à adoção de novas sanções, propondo novas tentativas de acordo na área diplomática. A Rússia porque só é dura com os EUA nos assuntos que dizem respeito diretamente a ela, como o escudo nuclear. E os chineses porque não brigam nunca, apenas ponderam. Por enquanto.
Assim, Amano continua dirigindo as investigações sobre o programa nuclear iraniano sem que ninguém (a não ser o Irã) tenha protestado por sua ligação de amizade com os EUA. Espera-se que, talvez um dia, ele seja ingrato com aqueles a quem deve sua eleição, e resolva imitar seu antecessor, El Baradei, passando a exercer suas funções de forma objetiva e imparcial.
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