Em entrevista exclusiva, prefeito condena a ansiedade dos que lhe cobram
maior presença nas ruas; "Essa é a fase decisiva para a execução do meu
plano de governo", justifica Fernando Haddad; "Sair de galocha e
guarda-chuva na rua de nada adiantaria"; em menos de 60 dias de gestão,
ele já contabiliza realizações e justifica o corte de 20% em gastos de
todas as secretarias; "Minha obsessão é elevar de R$ 3 bilhões para R$ 6
bilhões o investimento de São Paulo"
247 – No quinto andar da sede da Prefeitura de São
Paulo, Fernando Haddad senta-se à cabeceira da mesa de reuniões
pontualmente. Parece tenso. A poucos dias de completar dois meses de
gestão, ele já recebeu críticas pela sombra projetada por Lula, em
visita a ele e dez secretários municipais, viu a cidade sofrer quase uma
centena de alagamentos com as chuvas de verão e ficar às escuras numa
série de blecautes. Foi o bastante para que ele ratificasse, na prática,
sua compreensão sobre o cargo que ocupa. "Essa é a função mais complexa
do País", definiu Haddad na entrevista exclusiva desta tarde ao 247.
Sua primeira preocupação foi dissipar a ansiedade dos que lhe cobram,
dentro e fora do governo, uma maior presença pessoal nas ruas, como
tiveram, para o bem e o mal, praticamente todos os seus antecessores.
"De nada adiantaria eu sair de galocha e guarda-chuva pelas ruas",
inicia ele. "A fase atual é de conseguir os meios para executar meu
plano de governo. Pela lei, tenho 90 dias para fazer isso. Se não fizer
agora, vou me arrepender depois".
Na véspera, o prefeito determinou o corte de 20% em contratos
terceirizados, que somam cerca de R$ 14 bilhões, em todas as
Secretarias. "Estamos gastando muito no custeio. Sem o corte, a gestão
estaria inviabilizada". Haddad garante que essa paralisação da máquina
administrativa não vai acontecer. Ele já trabalha com uma meta
quantitativa de fazer a capacidade de investimento da cidade saltar dos
atuais R$ 3 bilhões para R$ 6 bilhões.
- É a minha obsessão. O dinheiro novo virá pelo mapeamento de todas
as parcerias possíveis com os governos federal e estadual. Nosso foco é
esse.
MORADIAS EM CONSTRUÇÃO - O prefeito, agora, abre um
sorriso. Ele passa a enumerar as realizações que já contabiliza antes
mesmo de completar oito semanas no cargo. Uma delas: a construção, já
iniciada, de quatro mil apartamentos no centro de São Paulo, de um total
de 20 mil contratados. Isso foi conseguido por meio de uma parceria
entre a cidade, o governo do Estado, que tem o programa Casa Paulista, e
o governo federal, com o seu Minha Casa, Minha Vida.
"Conseguimos esse alinhamento em apenas 20 dias, num assunto que
estava sem solução há duas décadas", comemora. "É um feito e tanto, sem
falsa modéstia". Com a chegada de milhares de novos moradores para a
região central, já a partir do próximo ano, a combalida zona central vai
ganhar novas feições. "Com gente morando e vida noturna, o centro
começará a resolver seus problemas e a ser devolvido para o uso de todos
os cidadãos".
Ele não foge da responsabilidade sobre a segurança pública, setor no
qual os índices de criminalidade estão em elevação. "Já mudamos a função
da Guarda Municipal Metropolitana, que até agora só cuidava de
camelôs", resume. "Acho que um efetivo de 6,5 mil policiais só para
isso, sem nenhuma função noturna, é um pouco exagerado", sustenta com
leve ironia. A partir de agora, um terço desse efetivo será dirigido
para o trabalho de rondas diárias, presença em pontos determinados e
efetiva ação policial, com orientação para abordar suspeitos e
interferir em situações de conflito. A Prefeitura já anunciou a abertura
de um concurso para a contratação de mais dois mil policiais para a
GCM.
ATRASO DA MÍDIA - Haddad já demarca seu estilo, mas
parece ir compreendendo aos poucos o estilo da mídia que cobre seus
movimentos como prefeito. "Há reclamações não sobre falta de
planejamento, mas sim de ausência de pirotecnia por aqui. Acho isso um
atraso de quem faz a cobertura". Ele exemplifica. Cobrado, primeiramente
por 247, por não ter ido ver pessoalmente as áreas de alagamentos na
cidade, duas semanas atrás, quando dezenas de carros foram inutilizados
elas águas, centenas de semáforos ficaram sem funcionar, árvores caíram
e até a sede do São Paulo Futebol Clube ficou debaixo de lama, Haddad
retorquiu.
"No último sábado, fui à Estrada do M´Boi Mirim para autorizar o
início de uma obra viária que estava embargada há 18 anos. Nenhum
repórter, de nenhum veículo, se interessou por ir até lá", asseverou.
"Não é que eu não goste de sair do gabinete, nem considere que fazer
isso não é importante, mas é preciso entender que se eu não completar o
planejamento dos próximos quatro anos agora, depois não será mais
possível".
Seguro, o prefeito dispara: "Não me interessa saber o que estão
achando dos primeiros seis meses do meu governo, mas sim o que vão dizer
nos últimos seis meses da gestão. Por isso, o trabalho aqui tem um
plano com começo, meio e fim". Na educação, por exemplo, sua meta é
terminar a gestão com 100 mil crianças, de um universo de 500 mil
alunos, estudando em período integral.
Não há espaço, neste discurso, para discutir que tipo de herança ele
recebeu do antecessor Gilberto Kassab, do PSD. "Não fico remoendo o
passado, mas algumas coisas que já estamos fazendo só foram possíveis
porque a equipe anterior trabalhou direito", afirma. Ele criticou a
administração passada, no entanto, ao constatar que os semáforos de São
Paulo ficaram às escuras por falta de peças de reposição. "Me
perguntaram e eu disse que aquele situação era precária, sou
transparente".
CORRUPÇÃO SOB VIGILÂNCIA - Corrupção é um vírus do
qual, com a instalação da Controladoria Geral do Município, o prefeito
procurou se imunizar. Ele nomeou para o cargo Marcos Vinícius Spinelli,
que era o secretário nacional de Prevenção da Corrupção e de Informações
do governo Dilma. "É o cara que mais entende desse assunto no Brasil",
avisa o prefeito. "Nem quero saber o que ele vai investigar, os
processos que vai abrir. Ele tem autonomia para fazer um bom trabalho". À
mesa de Spinelli, os primeiros casos já começam a chegar, mas Haddad
não sabe do que se trata. "A Controladoria está se estruturando e já
trabalhando ao mesmo tempo".
Em linha direta com a presidente Dilma e o ex-presidente Lula, Haddad
achou "incompreensível" o tratamento dado na mídia tradicional para a
visita de Lula à Prefeitura, quando o chefe político sentou-se no centro
da mesa de reuniões, entre o prefeito e a vice Nadia Campeão, e
distribuiu conselhos para dez secretários municipais. "Ele falou com
gente que conhece há mais tempo até do que eu. Ele trabalhou com afinco
pela minha eleição, fez isso depois de vencer um câncer, e talvez tenha
sido a pessoa que mais ficou feliz com a vitória. Qual o problema em
tê-lo recebido? Foi a coisa mais normal", acredita o prefeito. "Se o
presidente Fernando Henrique quiser me visitar, eu vou dizer não a ele?
Claro que não", completa.
As relações com o governo da presidente Dilma vão bem, como se pode
ver na liberação de R$ 700 milhões em verbas federais para a canalização
de córregos. "Com meus oito anos de governo, sou o cara que está fora
do governo federal que mais o conhece", frisa. "A viabilização da minha
gestão passa por essa parceria permanente". Ele também está satisfeito
com o grau de entendimento com o governador Geraldo Alckmin, do PSDB.
"Nossa sintonia é muito boa, trabalhamos por objetivos muito
semelhantes", disse. O prefeito até fez autocrítica sobre sua oposição,
num primeiro momento, à decisão de Alckmin de internar compulsoriamente
os viciados em crack. "Num primeiro momento, não havia nem mesmo a
necessidade da presença do poder Judiciário, seria uma bagunça", disse.
"Agora, o modelo está melhor formatado, devo fazer essa correção por
questão de justiça".
O prefeito não teme, a esta altura, as relações com o PT e a Câmara
Municipal. "Do meu ponto de vista, minha relação com o meu partido está
absolutamente normal", pontuou. "Algumas reclamações são normais". Ele
defendeu que seria contraproducente entregar aos militantes do PT todos
os cargos pedidos nas subprefeituras. "Se elas forem mal avaliadas, isso
será ruim para os vereadores e todo o partido. Mas se o trabalho for
bem, todos sairão mais fortaleicidos".
Diante dos vereadores, ele lembra de ter conseguido, em seus tempos
de ministro da Educação, passar projetos no Congresso com o voto dos
deputados do PSDB. "Aqui espero ter a mesma relação. Fora um ou dois,
que nós já mapeamos, os outros terão, estou certo, uma relação muito
correta comigo", acrescentou, sem querer citar nomes.
EXEMPLO PARA SI MESMO - Perto da hora de receber, em
seu gabinete de despachos, o vice-governador Guilherme Afif, Haddad
recusa o rótulo de ter resvalado, durante sua campanha, pelo populismo,
ao prometer o fim da inspeção veicular em São Paulo. "Eu disse que
devolveria o dinheiro gasto pelo cidadão, e projeto de lei neste sentido
já está na Câmara Municipal", acentuou. "Quem está chamando a Controlar
de inidônea não sou eu, mas o Tribunal de Justiça. Por mim romperia o
contrato agora, mas aqui na administração pública as coisas não
funcionam como entre as pessoas físicas". Para o prefeito, toda a região
metropolitana demanda a inspeção veicular, caso contrário ela passa a
ser desnecessária para a capital. "Do jeito que está, o modelo só
interessa à Controlar, enquanto os paulistanos já pagam mais de um
bilhão de reais em IPVA".
Qual a grande meta do seu governo?
- Se eu transformar a Prefeitura como mudei o Ministério da Educação,
com uma ponta de orgulho vou dizer que cumpri minha missão. Lá, no dia
da minha saída, o MEC foi eleito o órgão público melhor avaliado por uma
pesquisa nacional popular. Quero fazer uma gestão aqui com a mesma
excelência feita lá. (Entrevista concedida a Leonardo Attuch e Marco Damiani)
Do 247
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