As grandes empresas brasileiras de comunicação se reuniram nos dois
últimos dias em São Paulo para discutir o futuro do setor. Com
pouquíssimas variações, o teor dos discursos foi mais uma repetição do
que vem sendo dito desde... 1993. A palavra de ordem, segundo os jornais
desta quinta-feira (7/11), é a mesma de quando a imprensa foi
impactada pela criação do primeiro browser comercial da internet, o Mosaic.
Vinte anos depois da ruptura provocada pela tecnologia digital, os
gestores de jornais ainda falam de sinergia como a panaceia de todos os
negócios.
O Seminário Internacional de Jornais é uma iniciativa da INMA, sigla em
inglês para Associação Internacional de Marketing de Imprensa, evento
que reúne dirigentes e profissionais de marketing de empresas
jornalísticas. Faz parte do esforço do setor para interromper a crise
que se desenrola com a perda de receita da publicidade e queda nas
vendas. Os temas do encontro incluem o efeito da expansão da mobilidade
do público, pela popularização dos telefones com acesso à internet; as
novas competências do setor; a publicidade digital e a construção de
marcas multimídia.
O evento não parece entusiasmar as empresas, uma vez que apenas o Globo e a Folha de S. Paulo têm
dado algum espaço para os debates. Pelo que se pode ler dessas fontes e
do site oficial do seminário, trata-se de mais do mesmo, ou seja, os
gestores da imprensa seguem repetindo o que declaram há vinte anos, com
poucas variações. O novo nome da sinergia é “multiplataforma”, ou seja,
os jornais acreditam que basta juntar numa mesma sala os editores e os
profissionais de Tecnologia da Informação para produzir conteúdos que
possam ser aproveitados em todas as mídias, que tudo estará resolvido.
O representante do Estado de S. Paulo anunciou que desde agosto o
jornal paulista tem equipes multimídia, com jornalistas e técnicos
trabalhando lado a lado. Ele esqueceu ou ignora que o projeto original
do Estado na Internet já funcionava com equipes mistas desde o
primeiro dia, no início dos anos 1990, e que o primeiro nome da
iniciativa era Estadão Multimídia. De lá para cá, o que era futuro se
tornou realidade, mas as empresas jornalísticas seguem discutindo a
“sinergia”.
Quanto vale a notícia?
Também se falou muito do sucesso obtido com o modelo de cobrança para o
acesso a notícias, que, segundo os relatos disponíveis, tem permitido
aumentar a audiência e registra algum avanço na receita. Mas não há
referência ao fato de que o aumento do número de leitores nas versões
digitais dos jornais não produz o crescimento correspondente do ganho
com publicidade. Por outro lado, os gestores de jornais elegeram como
inimigos preferenciais o Google e o Facebook, tomando como critério
apenas o que consideram valor de face da notícia.
A grande “sacada” geral das empresas de comunicação é que, duas décadas depois do big bang da
internet, “o jornal não é mais um produto, mas uma plataforma de
muitas faces, que tem no conteúdo de qualidade o seu maior valor”,
conforme declarou o representante do Globo. A frase é boa, mas
esconde o grande dilema do setor: a questão da imprensa não é mais o
modelo de negócio, mas a própria natureza da atividade jornalística. A
grande pergunta é: quanto vale a mediação num ambiente em que cada
pessoa é potencialmente uma mídia?
A disputa dos jornais com o Google e o Facebook se refere às margens de
ganho de cada parte, comparada ao peso de cada um na produção e
distribuição do conteúdo jornalístico. Mas essa discussão não leva em
conta, no lado da imprensa, que as duas potências digitais são os
protagonistas centrais no contexto em que se desenvolvem novas formas de
vínculos sociais. Seria certamente mais produtivo se a mídia
tradicional buscasse um acordo para se propor como um sistema de
ancoragem dos conteúdos que trafegam nas redes digitais, abandonando a
ilusão de que ainda ocupa o centro do ecossistema comunicacional.
Acontece que os jornais vivem uma ilusão do controle. Seus dirigentes
imaginam que ainda controlam o fluxo da comunicação na sociedade
contemporânea. No entanto, já não falam diretamente à sociedade, mas
cumprem um papel marginal, dialogando com as instituições. Por exemplo,
os jornais falam aos partidos políticos, mas não aos eleitores. No dia
em que o Google e o Facebook decidirem apoiar cooperativas de
jornalistas, criando seus próprios conteúdos com novas marcas, a
imprensa que conhecemos vai virar passado.
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