Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
Praça Tahrir em 24/11/2011
A irrupção de novos protestos de massa na Praça Tahrir no Egito, que exigem o fim do governo da junta militar, meteu EUA e Turquia nos cornos de um dilema.
Washington não pode não ver que os manifestantes exigem mudança democrática e fim da ditadura militar. De fato, os EUA exercem enorme influência sobre os militares egípcios, que recebem, anualmente, 5 bilhões de dólares dos EUA em ajuda militar. Mas Washington não deseja ver aqueles seus militares fora do poder. Porque a oposição democrática é comandada, no Egito, por forças que os EUA absolutamente não controlam, em particular, a Fraternidade Muçulmana.
Sim, é verdade que os EUA fizeram contatos ‘nos níveis inferiores’ com a Fraternidade Muçulmana, mas ainda falta muito para que se desenvolva “diálogo construtivo” propriamente dito. O que mais preocupa os EUA é a posição “dos Irmãos” da FM em inúmeras questões que envolvem Israel (a posição da FM sobre o tratado de paz entre Egito e Israel; a cooperação de segurança entre Egito e Israel; o Hamás; o Irã, etc. Israel já disse, até, que Teerã mantém contato com grupos da Fraternidade Muçulmana. (De fato, a Fraternidade Muçulmana nada tem de monolítica.) Em resumo, os interesses geopolíticos dos EUA estarão muito mais bem atendidos, se a mudança democrática for mandada para o fundo da sala, de castigo, no Egito.
Será engraçado ouvir o que dirá Barack Obama. Se falar duro demais contra os militares, o lobby israelense enlouquecerá em Washington, e os Republicanos saltarão para a ofensiva mais furiosa. Mas se ficar de bico fechado, se enredará na ironia mãe de todas as ironias. Não esqueçamos: Obama escolheu a Universidade do Cairo, em 2009, para cenário daquele famoso discurso. Foi ou não foi?
A Turquia também está andando sobre brasas, mas de outro ponto de vista. Os militares egípcios, querem, evidentemente, ter papel constitucional ‘independente’, “ao estilo turco”, na vida política do país. O primeiro-ministro turco Recep Erdogan visitou em grande estilo o Egito, há dois meses. E aconselhou o povo egípcio a seguir caminho secular. A Fraternidade Muçulmana enfureceu-se. Outros grupos islamistas fizeram eco aos “Irmãos” e também atacaram Erdogan. A Turquia, pois, está hoje em posição delicada e embaraçosa. Não quer mais que o Egito a tome como modelo a seguir. O “modelo turco” parece talhado sob medida para ditadores militares, sim... Mas essa imagem não é exatamente a que mais interessa à Turquia exibir no Oriente Médio.
Show à parte será a Jordânia. Estão ouvindo os primeiros sinais da tempestade que se arma na Jordânia? Outra vez, a Fraternidade Muçulmana pode abrir as comportas para fazer crescer a onda democrática na Jordânia, sobretudo se os protestos no Egito ganharem força. Não surpreende que agora – depois de onze anos! – o rei Abdullah da Jordânia tenha afinal feito uma visita à Cisjordânia.
O que acontecer no Egito terá consequências gigantescas para toda a política do Oriente Médio. Obama e Erdogan devem estar balançando a cabeça, em desespero. Nem um nem outro, até agora, achou o que dizer. Erdogan tem preferido falar sobre a Síria. Seus aliados no Golfo Persa sentir-se-ão gravemente incomodados caso os ventos democráticos que sopram no Egito venham, eventualmente, a sacudir também as ditaduras do Golfo.
Mais uma vez, o único país que terá razões genuínas para saudar a luta dos que lutam e resistem na Praça Tahrir será... Bem... Será o Irã.
*MK Bhadrakumar foi diplomata de carreira do Serviço Exterior da Índia. Prestou serviços na União Soviética, Coreia do Sul, Sri Lanka, Alemanha, Afeganistão, Paquistão, Uzbequistão e Turquia. É especialista em questões do Afeganistão e Paquistão e escreve sobre temas de energia e segurança para várias publicações, dentre as quais The Hindu, Asia Online e Indian Punchline. É o filho mais velho de MK Kumaran (1915–1994), famoso escritor, jornalista, tradutor e militante de Kerala.
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